A ALDEIA DA BAHIA - 471 ANOS

Tasso Franco
23/03/2007 às 10:28
 

         Estamos no mês de aniversário da cidade do Salvador da Bahia que completará 458 anos de fundada, em 29 de março próximo. Mudei o título da crônica de propósito para fazer comparativos com Olinda-Recife, cidades que nasceram geminadas, diferentemente da Aldeia da Bahia, mas, na mesma época de instalação das Capitanias Hereditárias, por determinação do então rei de Portugal, Dom João III (reinado entre 1521-1557).

         Ora, Olinda e Recife vão comemorar hoje 170 anos; enquanto Salvador, que é a capital mais antiga do país, 158 anos de existência. Por que isso? Simplesmente porque Olinda e Recife instituíram como datas de suas fundações a chegada do donatório português a Pernambuco, Duarte Coelho Pereira, que aportou naquelas localidades em 12 de março de 1537 e ao avistar uma área montanhosa e bela teria dito: Oh! Linda situção para uma vila.

         Duarte Coelho enfrentou os nativos tabajaras e caetés e fundou Olinda na mesma época em que Francisco Pereira Coutinho, donatário da Bahia, chegou a Aldeia da Bahia, no atual Porto da Barra, expandiu o povoamento e instituiu a Vila Velha do Pereira, a partir de 1536. Então, a rigor, se fosse contar por essa data, Salvador completaria 171 anos. E, se for mais rigoroso observando-se a Aldeia da Bahia organizada por Diogo Álvares, o Caramuru, Salvador teria 196 ou 197 anos, pois, os informes são de que este galaico-minhoto (português da região da Galícia do rio Minho) teria naufragado em Salvador entre 1509/1511.                      

         Antonio Risério, em Uma História da Cidade da Bahia, relata no capítulo A Aldeia da Bahia que, em 1535, a nau São Pedro "da desastrada expedição do português Simão de Alcazaba, então a serviço do rei de Castela, ao Estreito de Magalhães, achava-se tranqüilamente ancorada em meio às águas mansas e cheias de uma baia que se chama Todos os Santos, que é na Terra do Brasil". Destaca ainda Risério que foi recebida por Diogo Caramuru, "em sua aldeia, sincrética e tropical".

         E, segundo o historiador baiano, "é graças aos depoimentos dessa gente, organizados em narrativas escrita por Oviedo y Valdés, ainda na centúria dos quinhentos, em sua Historia General y Natural de las Índias, que temos aquele que é o retrato mais completo da aldeia eurotupinambá da Bahia". Adiante, salienta Risério: "O porte da sua aldeia não deixa de ser admirável. Não era uma povoazinha qualquer, insignificante, com meia dúzia de fogos ao redor de uma fogueira. Oviedo fala em umas 300 casas" - em español - caserias desparçidas pero á vista unas de otras muchas dellas".

         Vejam bem: isso é em 1535, portanto, antes mesmo da fundação de Olinda que só se daria dois anos depois, mesmo assim, considerando a frase inspiradora de Duarte Coelho (oh! Linda situação para uma vila) sem uma casinha sequer à vista. Os pernambucanos, no entanto, foram mais fiéis à história e se não consideraram o ato de Dom João III para institução das Capitanias Hereditárias no Brasil, em 1534, comum a todos - Bahia, Pernambuco, Ilhéus, Espírito Santo, etc - pelos menos consignaram como a data de fundação de suas cidades geminadas (Recife, inicialmente, um porto 6 km ao Norte de Olinda) a data de chegada do seu donatário.

         Na Bahia, ao contrário, os historiadores não consideraram Francisco Pereira Coutinho, o Rusticão, guerreiro do Oriente, que aportou na enseada da Bahia, em 1536. E, ainda menos, a aldeia eurotupinambá da Bahia, como bem cita Risério, passando a borracha nesses momentos históricos extraordinários e só consideraram a chegada do governador geral, Tomé de Souza, com sua armada, que aportou na barra da Bahia, em 29 de março de 1549.

         Isso foi sacramentado num Congresso de História da Bahia realizado na década de 1940, no Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, após longa discussão, muito mais relacionada com as datas a partir de 29 de março (data da chegada de Tomé de Souza); 1º de maio de 1549 (data de início das obras de construção da cidade); 13 de junho (data da primeira procissão de Corpus Cristhi).

         Mexer nessas determinações é sempre problemático, mas, bem que o IGHB deveria promover um novo encontro de historiadores para reconsiderar essa data levando em conta os aspectos da Aldeia Eurotupinambá (é aqui que se inicia a miscigenação brasileira) e da Vila Velha do Pereira; assim como deveria repor o nome da Rua dos Mercadores ou Antiga Direita do Palácio, hoje com o insignificante nome de Rua Chile.

         Essa é uma outra questão cabulosa e inadmissíel, uma vez que a cidade do Salvador possui a rua mais antiga do Brasil, posta assim em termos de capital, com 458 anos, e comemora-se como sendo uma centuária de Rua Chile, codinome que homenageou uma esquadra chilena no Porto de Salvador estacionada no início do século passado. Isso é uma situação que não tem cabimento.

         Acorda também Câmara de Vereadores. Os sinos estão dobrando em silêncio.