A POLUIÇÃO DO RIO SUBAÉ

Antonio Jorge Moura
23/01/2009 às 15:05
Depois do episódio do mercúrio, quero lhes relatar o caso da contaminação do rio Subaé, que nasce em Feira de Santana e corta o centro urbano de Santo Amaro da Purificação, terra de Dona Cano e dos Veloso, por chumbo, zinco e cádmio, três metais pesados extremamente perigosos para o ser humano se ingeridos em concentrações acima do tolerado.
 
O chumbo causa o saturnismo, doença ambiental que se conhece desde os primórdios da Idade Antiga. E o cádmio causa a moléstia que ficou conhecida como Doença de Itai-Itai, surgida no Japão industrializado pós II Guerra Mundial. Ela causa dores lascinantes e a fratura dos ossos do corpo por uma simples pressão com as mãos. Os ossos, em suma, viram farófia.
 
A poluição do rio Subaé - e, consequentemente, da Baía de Todos os Santos, onde o curso d´água desemboca - foi causada pelo despejo dos esgotos industriais da usina de chumbo chamada Cobrac (Companhia Brasileira de Chumbo), hoje desativada, que processava o minério retirado de uma mina que existiu no município de Boquira, terra do falecido jornalista Francisco Alexandria.
 
Estima-se que a usina tenha despejado no rio e na baía algo em torno de 400 toneladas de minério. O interessante é que ambas - a mina e a usina - pertenceram ao Barão de Rotchild. da nobre família francesa Rotchild. Ou seja, o Primeiro Mundo poluiu o Terceiro Mundo e ficou por isso mesmo. "Purificar o Subaé, mandar os malditos embora. Dona da água doce quem é...".

Os versos e a canção de Caetano Veloso surgiram como um protesto musical do genial baiano logo após a denúncia da imprensa sobre a perigosa poluição. Se o trabalho do jornalismo não encorajou o Governo da Bahia e/ a Prefeitura de Santo Amaro da Purificação a exigir indenização nos foros internacionais à Família Rotchild, pelo menos insuflou a criatividade e a sensibilidade do poeta.
 
Mas ainda é tempo dos organismos oficiais agirem em defesa da população de Santo Amaro, dos operários envenenados e dos moradores contaminados pela ganância francesa. Um aspecto interessante foi o acaso da descoberta da gravidade da poluição do Subaé, embora fosse público e notório que os restos da limalha de chumbo processado pela usina tenha sido usado para aterrar e asfaltar ruas em Santo Amaro.

E que a população, sobretudo as crianças, inalava a poeira da limalha quando o vento soprava ou algum veículo passava pela rua urbanizada como aterro poluidor. Periodicamente, a Cobrac substituía um pano grosso, muito mais resistente que o índigo blue usado para confecção de calça jeans, quando fazia a substituição da "mangueira de filtro" de suas chaminés. Esse pano grosso retinha partículas milimétricas da poeira de chumbo que saiam de suas caldeiras pelas chaminés.

E eram jogados no lixo, onde a população pobre de Santo Amaro os catava e levava para casa para servir, depois de lavado toscamente, pasmem, de toalha de mesa. Absurdo! Foi quando um pesquisador da Faculdade de Química da UFBA, de nome Oscar Nogueira, foi testar o uso de um instrumento chamado Espectofotômetro de Absorção Atômica.

Ele precisava de água de onde se suspeitasse houvesse presença de chumbo em suspensão. Ele usou a água do Subaé. E coletou, como termo de referência ou comparação, água do mar de Guaimbim, em Valença, na época totalmente despoluída. Quando ele colocava o água do Subaé no aparelho e media a concentração de chumbo, o medidor do Espectofofômetro dava um verdadeiro pico. Ele ficou intrigado e foi consultar a biografia química.
 
O conhecimento acumulado a nível internacional indicou que, em casos como aquele, não havia presença de chumbo mas, sim, de cádmio, um metal pesado extremamente perigoso para o ser humano. Oscar Nogueira pediu ajuda à professora Tânia Tavares, orientadora de pesquisa, que mobilizou também o Mestrado de Medicina Comunitária da UFBA para estudar o caso, que envolvia pessoas que viviam nas margens do rio. Entre os pesquisadores estava o médico Fernando Carvalho.

Eles têm tudo sobre esse caso. A primeira conseqüência do escândalo foi o fechamento da Cobrac, determinada pelo Governo do Estado, que pode agora se mobilizar para exigir indenização dos franceses da Família Rotchild. Além da poluição de Santo Amaro e da Baía de Todos os Santos, eles transformaram Boquira numa terra de crateras pior que a Lua. É um caso jurídico de Direito Internacional e de muita coragem
cívica.