Colunistas / Esportes
Zé de Jesus Barrêto

UM 7 DE ABRIL histórico para o futebol baiano

O nome do novo estádio que vai popularizar é o povo. Ele, sempre esquecido em todos os movimentos, salvo para fazer testes e votar.
04/04/2013 às 14:14
Tá chegando a hora !
   
   Dia 5, sexta, é a inauguração oficial da nova Fonte Nova, ou Complexo (?) Esportivo Octávio Mangabeira, ou, como querem os novos ‘donos’ do estádio : Itaipava Arena Fonte Nova. É nome pra todo gosto, mas vamos ver qual deles vai pegar no gosto, na língua do povo, povo que sempre foi apaixonado pela velha Fonte Nova. 

   Na inauguração oficial vai ter placa, discursos, homenagens, agradecimentos, muito político querendo aparecer como ‘pai’ da Fonte, perus a granel.  E as presenças anunciadas da presidenta Dilma, do governador JW, do prefeito Netinho, do ‘capo’ da CBF, do (m)sinistro do Esporte, ‘otoridades’  de montão... e povão de fora. Até este instante, tudo confirmado. Ou ...

  *
   No domingo, dia 7, a Deus querer, vamos ter o clássico Ba X Vi, valendo pontos pelo Campeonato Baiano, histórico, o primeiro jogo no estádio, descabaçando o gramado verdinho, linheiro.  

   Antes de a bola rolar os privilegiados torcedores agraciados com convites ou que conseguiram ingressos, caríssimos, e estarão nas arquibancadas vão ver hora e meia de show com artistas locais : Margareth? Ivete? Claudinha ? Se Ivete pintar vai levar vaia da torcida tricolor? Ela andou chamando o Bahia de ‘carniça”. A torcida rubronegra vai vaiar Claudinha, assumida tricolorete?  E vão bater também os tambores do Olodum, que andou se embrulhando com o rubronegro em função de um descuido na impressão do escudo do clube na ‘mortalha’ de carnaval do bloco. Vão rolar malestares gerais?  

  Nem dá para imaginar a expectativa de todos: autoridades, dirigentes dos clubes, equipes técnicas, atletas, árbitros, gandulas, policiais e seguranças, torcedores, a mídia esportiva ... Todos! Festa, data pra não esquecer, pra todo mundo registrar com fotos de celulares e guardar para mostrar aos netinhos, amanhã ...  ‘Eu tava lá, veja !’ 

   Afinal, o evento vai chamar a atenção do país inteiro, do planeta bola. Todos de olho em  Salvador, no novo estádio para a Copa de 2014.

*

   Senhor do Bomfim queira que tudo funcione a contento, dentro e fora do estádio. 
   
    Que a cidade flua, sem engarrafamentos, que haja estacionamentos, escoamento normal pós jogo...  e SEGURANÇA !  Sem bagunça, sem tumulto.  Como vai funcionar o entorno do estádio, como será feito o controle e a orientação do torcedor,  o acesso, a chegada das autoridades?    Isso tudo exige planejamento, equipes  em ação e um pouco de sorte. 

   
 Estranho não se poder  estacionar mais próximo do estádio.  Cadê os estacionamentos previstos no projeto apresentado antes?  Isso de fechar vias e por  todos  a paletar mais de um km para chegar aos portões do estádio é uma insensatez.  E os idosos? As crianças?  Os gordos, as grávidas?  Excluídos? Estacionar no Ogunjá ? quem garante a segurança lá?  Isso não vai prestar.  Mas... vamos ver !    

  Aliás, é inadmissível que se inaugure um equipamento desse porte, quase no centro da cidade, e não haja um estacionamento adequado.  Oferecem a rua, a via pública, o meio-fio à mais de um km de distância, sem nenhuma garantia de segurança para os veículos e seus respectivos proprietários.  Quiéiiissso?  Faça-me uma ‘garapa’.  Vão construir estacionamentos para a Copa ou vai ficar nisso?  Cadê o prometido no projeto inicial apresentado?  
 
*

   Quantas perguntas ...
 
   Os assentos numerados estarão valendo ou cada um vai se aboletar onde achar por bem e  fica tudo por isso mesmo?   O palco, o som, a iluminação ...  Será que vai chover ?  E se chover de vera, Deus meu, será que o gramado encharca, agüenta? E será que aquelas tais películas de cobertura do estádio suportarão um pé d’água daqueles que costumam desabar sobre a cidade nos meses de abril e maio? Hum ?   

  Começo dessa semana bastou uma chuvinha na madrugada para  a cobertura vazar e  um setor de cadeira  encher de água, sem escoamento. Foi preciso o velho balde, vassou, rodo e pano de chão pra enxugar tudo.  Primeiro Mundo ? 

*

   Do lado de fora, do lado de dentro ... 
   Vai ter o tabuleiro de acarajé, aquele cheirinho de dendê no ar ?  Onde ? E a ‘Kombi do reggae’,  o churrasquinho de gato, a loura bem gelada, o isopor, a água, o refri,  a pipoca, o amendoim, o roletinho de cana ?  Os vendedores ambulantes terão acesso ou serão rejeitados pelos novos ‘proprietários’ do estádio? 

   
    Como essas coisas, tão baianas, vão se acomodar nessa tal Arena modelo Amsterdã, padrão FIFA europeu agora comandada por um consórcio privado e patrocinada pela Itaipava ?   Não há como não pensar nessas coisas. 

   
   É cultura, faz parte do nosso comportamento esses fazeres de rua, esses festejos, essas comilanças, esse batuque...  Cada povo tem seu jeito de fazer, de agir, de gerir os acontecimentos, tem seu ritmo próprio de vida...  o baiano então !!!  Ou o povão será de vera e mais uma vez reprimido em suas manifestações  e quereres, excluído? 
 



 *
 

 As torcidas ...   

  Preocupa-me o comportamento do torcedor, a turminha ‘barra pesada’ de ‘Imbatíveis x Bamor’, por exemplo. Até porque eles se dividem em facções, comandos, feito gangues, bandidos... e prezam o confronto, a violência, o desatino. “O terror vai começar’, cantam  alucinados nas arquibancadas e fora delas também, com os olhos baços, distantes do movimento da pelota, dos atletas em campo. Querem comer o fígado do inimigo, bestiais como na idade média...    Temo a massa ensandecida.  Como controlar um lado e outro? 

  Vai entrar o bandeirão, bandeiras menores com hastes?  Nada de foguetes, sinalizadores, pelamodedeus! Chega!   Mas... E os instrumentos das bandas , das batucadas  das torcidas? O que será ou não permitido nessa ‘casa de espetáculos’  tão chique?  

 Que os ‘malucos’ não pulem sobre as cadeiras, não quebrem tudo como fizeram os gremistas, lá no sul tão ‘mais civilizado’...  Vamos ter grades, barreiras de policiais separando as torcidas?  Esperamos que, com qualquer resultado em campo, não destruam sanitários, dependências, que não levem pias, torneiras e latrinas pra casa.

*

  Espetáculo em campo

  E que, em campo, seja jogado um futebol de primeira, bonito, bem disputado, leal, com belos lances e gols...  
   Os jogadores estarão tensos, claro: quem vai querer fazer ‘lambança’ logo num dia de festa ? Quem fará o primeiro gol? Quem vencerá ?  Qual a torcida  que ocupará mais espaços nas arquibancadas? Quem fará a festa mais bonita ?

*

   A rivalidade é grande. O torcedor tricolor vai exigir um triunfo, que seria até simbólico : ‘aqui é nossa praça, a Fonte Nova, nosso campo, nosso mando, aqui cantamos de galo!’  
   Já o torcedor rubro-negro, tão orgulhoso do Barradão, vai querer ‘melar’ o gostinho tricolor e se impor : ‘ A Fonte Nova é nosso terreiro!’ .  A briga é boa e tem histórias. É hora de escrever mais uma página da história de nosso futebol. 

*

  O reinado 

   Na antiga Fonte Nova o Bahia reinou. Foi ali que o time ganhou seus grandes títulos, um bi-campeonato brasileiro, um penta (de 58 a 62) , um hepta  nos (anos 1970), e dominou amplamente o duelo com o rubronegro nas décadas de 70 e 80.

    
  Mas o grande rival  equilibrou  na década de 90 e  fez sua farra a partir da entrada desse novo século, anos 2000. Festas seguidas em vermelho e preto. O Vitória cresceu muuuito depois do Barradão, essa é uma realidade: dentro e fora de campo, com títulos, belas atuações e crescimento da torcida.
 
   Agora,  a dupla Ba Vi  está de volta, pau-a-pau na Primeira Divisão, Série A do Campeonato Nacional. E com um estádio de primeiro mundo para nele mostrar futebol de elite.  Mas, cadê os craques?  Onde estão os Osni, Mário Sérgio, Douglas, Roberto Rebouças de hoje ? 

É uma nova era que começa na Arena Fonte Nova.  Quem vai dar as cartas? 


*

 Elitização nas arquibancadas 

  Estádio de primeiro mundo, ingressos bem mais caros e certamente não teremos  o mesmo público povão que tem freqüentado o Barradão e Pituaçu nos dias de clássico. Teremos, de fato, uma elitização de público nas arquibancadas, vamos ter um novo estádio só ‘pra barão’?  ... 

   Ou seja, há muito o que torcer, há muito o que observar, estudar...   Ora, futebol também é cultura,  cabem olhares ‘antropo-sociológicos’, sim senhor .

   A nova Arena Fonte Nova será um belo campo de observação das mudanças, de novos  comportamentos, da interações sociais decorrentes dos novos estímulos urbanos, dos novos equipamentos de lazer oferecidos.

*

  Depois desse Ba Vi, dia 7, se tudo correr bem, vamos  ver o Bahia logo disputando seus jogos pelo baianão lá no novo gramado?   Bahia X Juazeirense vai ter público para justificar  o uso integral do novo equipamento com ingressos tão altos?

**

  A Copa das Confederações

  Pois bem, o segundo grande acontecimento esportivo do ano, depois da inauguração da Nova Fonte, virá na sequência, mês de junho, com a realização de no mínimo três jogos internacionais valendo pela Copa das Confederações, competição oficial da Fifa, uma espécie de prévia para a Copa do Mundo de 2014.  Casa cheia, ingressos vendidos, turismo em alta, a cidade estará em condições de receber delegações, turistas do mundo inteiro  e a mídia especializada  internacional ?      

   Nosso aeroporto está numa  situação lastimável. A cidade  vem de oito anos de descalabro, parece que foi varrida por um tsunami de incompetências. A pobreza nas ruas aflora, nossos serviços são péssimos, nossa banda larga é estreitíssima, a mobilidade urbana é só travação, a orla está  largada, o Pelourinho sem vida ...     Disso tudo vimos  falando e bradando faz teeempo !   
  
   *
  
   Mas...  O que  nos oferece a Copa das Confederações não é pouco; Serão jogos nunca vistos aqui na Bahia.  

   Vamos ter, por exemplo, o clássico Brasil X Itália, no dia 22 de junho, um sábado, feriadão em função da inusitada partida. São duas seleções Campeãs do Mundo – O Brasil tem cinco títulos e a Itália tem quatro, foram as que mais venceram copas.  Será o jogo internacional mais importante já realizado em Salvador.  Mais História pra ser escrita e ser contada. 


  Nigéria é Bahia

  Além desse clássico, teremos na Bahia a presença da seleção da Nigéria, atual campeã africana. Isso tem um significado especial para os baianos de Salvador e recôncavo, sobretudo. 
A Nigéria tem muito a ver com a formação cultural e religiosa de nossa gente. De lá vieram os povos nagôs  (Iorubanos ) , ketus,  malês, haussás...    Nossa gente negra, mestiça tem raízes na África e mais profundamente na Nigéria, Benim e Angola.   Pois, os nigerianos vão enfrentar o Uruguai,  na nova Fonte Nova.   
E a Bahia inteira vai torcer pra quem ? Adivinha !!!  Ora, o sangue nigeriano corre em nossas veias, o iorubá ainda é falado nos terreiros ketu/nagô da Bahia.  Os atabaques vão bater pros africanos, com certeza. Axé ! 

*

   E ainda vamos ver o jogo que vai decidir terceiro e quarto lugares da Copa das Confederações.  Mais um jogaço, com  duas ótimas equipes na disputa, com certeza.

   E depois... bem, vem a Copa do Mundo de 2014, coisa rara.  A única que aconteceu no Brasil foi em 1950, a grande maioria dos torcedores nem era viva. E a Bahia ficou de fora porque o estádio Octávio Mangabeira, ali mesmo, na ladeira da Fonte, não ficou pronto a tempo.   

  Pra este jovem ancião que voz escrevinha, que tinha apenas dois aninhos em 1950, será a chance única de ver uma Copa do Mundo com esses olhos que a terra um dia há de comer.

 Quem sabe consigo uma entrada que seja ?