Colunistas / Crônicas de Copacabana
Nara Franco

Crime do momento rouba a cena

Parece surrealismo, mas, são reais, casos verídicos
28/06/2019 às 19:26
Tem tanta coisa acontecendo no mundo e tão pouca coisa acontecendo no Rio de Janeiro, que fica difícil escrever uma crônica sobre o cotidiano carioca. Estou tendo uma espécie de bloqueio criativo. Então fui catar na memória "causos" da terra para diverti-los. Acabei lembrando de dois. 

Quem mora no Rio de Janeiro já se acostumou com o nível péssimo do atendimento em lojas, bares, restaurantes, táxis, Ubers, etc. A simpatia é grande, mas a eficiência é baixa. Bem baixa. Tem aquela intimidade surreal do garçom te chamando de "amor", "princesa", tem o motorista falando no celular enquanto dirige, tem a atendente da farmácia batendo papo enquanto você espera pelo remédio e tem também um nível de burrice assustador. 

Causo 1

Início da prorrogação do jogo Brasil x França, Copa do Mundo Feminina de Futebol. Todas as mesas do bar de olho na TV, inclusive a minha (com aproximadamente 10 pessoas). Dois minutos antes de a bola rolar, naquele 1x1 nervoso, o gerente do bar tirou o som da TV e os músicos agendados para o Ao Vivo da noite de ajeitaram. Como assim? TODAS as pessoas presentes no bar estavam ali para ver o jogo, gritando a cada passe da Marta, morrendo com o gol francês, pedindo para Debinha avançar. Fui indagar o gerente. 

A prorrogação tem 30 minutos, jogo empatado, eliminatório. A resposta dele? "A banda tem horário". É isso mesmo, Brasil? Não tinha uma lenda que o cliente tem sempre razão? Em uma cidade onde o consumo em bares e restaurantes caiu de 13% para 4%, o cidadão tinha que dar graças da Deus que a seleção feminina caiu nas graças do povo. Mas não .. cismou que a música tinha que começar. No primeiro acorde a gritaria foi geral. 

"Aumenta o som!", "cadê o jogo!!" e o gerente acabou cedendo. Pergunto: um cidadão com essa visão de negócios pode ser gerente de um bar? Coisas que só o Rio de Janeiro é capaz de fazer por você. Perdemos o jogo, mas eu ganhei o bolão marcando 1x1 no tempo regulamentar.

Causo 2
Supermercado vazio, vazio, fui conferir o preço da cerveja e me deparo com uma super promoção de iogurte. Coloco logo dez na cestinha (porque sou dessas) e compro papel higiênico (item em falta em casa) e 4 cervejas. O supermercado ali... às moscas. O único caixa livre era o de 10 itens, mas diante da escassez de clientes e do tédio da caixa, fui ao caixa de dez itens para não esperar. 

No que ela ao me ver prontamente respondeu: "Aqui só dez itens". Pensei em argumentar: "Minha querida, olha para esse mercado? Dá para contar nos dedos o número de pessoas comprando. Um caixa expresso é para quando o supermercado está lotado". Mas sabe? Deu preguiça e levei só o papel higiênico. 

Daí eu entendo porque algumas lojas fecham, outras mal sobrevivem a 30 dias em funcionamento. As pessoas são burras. Ou preguiçosas. Ou burras e preguiçosas. E nem sempre a gente está com boa vontade para argumentar ou dizer que ela vai perder uma boa venda. 

Uma vez, no auge do mau humor da atendente, tive a paciência de explicar à moça que diante dos 13 milhões de desempregados no país, ela devia acordar agradecida por ter um salário no fim do mês. Pelas minhas contas havia pelo menos 100 mil pessoas de olho no trabalho dela e que o mínimo que ela poderia fazer era me tratar bem. Tem dias que eu estou boazinha mesmo. 
                                                                              ****

E como eu ia esquecendo do Caso Flordelis? A deputada que teve o marido (pastor) assassinado? Todo brasileiro é técnico de futebol e ministro da Fazenda. Eu ouso dizer que todo carioca é delegado. Lemos tanto sobre crimes que temos uma incrível capacidade investigativa. Quando li no jornal que o pastor havia voltado à garagem de casa para pegar algo no carro mesmo sabendo que havia sido seguido, bingo! Não foi assalto.

 Quem em sã consciência faz isso morando no Rio de Janeiro?? E 30 tiros? Qual assaltante dá 30 tiros em alguém? Pois bem... os rumores na rua apontam que foi crime encomendado, morte matada. No mercadinho de frutas e legumes, dão certo que foi a deputada a mandante vingando-se de traição. Típico Nelson Rodrigues. Para tornar a realidade ainda mais emocionante, o autor dos disparos foi um dos 55 filhos do casal. Isso nem Nelson Rodrigues seria capaz de elaborar. 

Tive um professor de roteiro que dizia que nada que podíamos imaginar para um filme chegaria minimamente perto da vida real, muito mais dramática. Pura verdade. Qual roteirista pensaria que Sergio Cabral, ex-governador do Rio, ficaria sem banho de sol na cadeia por montar uma cinemateca na prisão? Coisas que só o Rio de Janeiro é capaz de fazer por você.