Economia

PORTO SANTOS ESGOTOU; BRASIL EXIGE UMA NOVA MATRIZ,por WALDECK ORNELAS

Manter moderno e atualizado o complexo portuário de Santos é fundamental para a economia brasileira, mas exige-se nova matriz portuária para o país
Waldeck Ornelas , Salvador | 06/01/2025 às 11:29
Waldeck: "Há um excesso de concentração de cargas no Porto de Santos"
Foto: BJÁ

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Tomo por empréstimo aqui, para aplicar ao Porto de Santos – o mais importante do país –, a expressão que o engenheiro Figueiredo Ferraz, então prefeito de São Paulo, utilizou em relação à cidade que dirigia, em face do crescimento exagerado e acelerado de sua população.

Era a época do “Sul maravilha” e as hordas de migrantes não paravam de chegar, provenientes sobretudo do Nordeste, atraídas pelo milagre econômico, mas que ultrapassavam largamente os esforços que a prefeitura seria capaz de realizar para acolhê-los na cidade.

Hoje em dia, é o excesso de concentração de cargas no Porto de Santos que chama a atenção do país, transbordando, espontaneamente e a olhos vistos, para os portos do Paraná e Santa Catarina, ao sul, e Rio de Janeiro e Espírito Santo, ao norte, numa clara indicação da necessidade de novas alternativas de atendimento ao fluxo marítimo nacional.

Incidentes com navios de 366 metros de LOA têm ocorrido, causando interrupções nas atividades, e tendem a se tornar mais frequentes à medida em que navios de maior porte – como os de 400 metros de LOA – comecem a chegar. Isso indica uma saturação no tráfego de embarcações, o que impacta negativamente as operações nos diversos terminais

Manter moderno e atualizado o complexo portuário de Santos é fundamental para a economia brasileira. Expandi-lo continuadamente, contudo, começa a apresentar custos (deseconomias?) até maiores fora do porto que dentro dele. É o caso da necessidade de uma terceira pista no sistema Anchieta-Imigrantes ou do túnel de ligação Santos-Guarujá.

Santos precisa, é certo, ampliar a sua capacidade operacional, sobretudo em relação à movimentação de contêineres, como é o caso da licitação para o STS10. Os investimentos devem estar voltados, portanto, para a melhoria da qualidade e segurança das operações e para a interface porto – cidade, em que se destaca, no presente, o Parque do Valongo.

Além do transbordamento das cargas para os portos mais próximos, novos terminais de cruzeiros são anunciados, como em São Sebastião (Home Port) ou em Praia Grande (Litoral Plaza Port). São indicativos de que Santos deve se concentrar mesmo é no imenso volume de cargas de que necessita dar conta.

Santos precisa continuar cumprindo, e com a máxima eficiência possível, o seu importante papel em relação ao principal polo econômico nacional – São Paulo –, mas já não pode mais responder pelo imenso volume de cargas de todo o país. É chegada a hora de planejar o fim dessa concentração!

Surge, assim, a oportunidade para implantar uma nova estratégia de expansão portuária, capaz de corresponder à desconcentração da economia nacional, que se não vem por planejamento, chega por força das deseconomias de aglomeração. Mas é preciso planejar, e com visão de longo prazo.

Não é que Santos deva diminuir de tamanho, mas precisa ser direcionado para atender à sua missão – que é o maior polo econômico do país – ao invés de ficar disputando as cargas do Centro-Oeste, do Sul, do Nordeste e até do Norte!

O Brasil é um grande país, não apenas por sua extensão continental, mas sobretudo pelo tamanho de sua economia e, como tal, não pode ter apenas um único porto de grande porte. Precisa, como a China, ter várias portas de acesso para o fluxo de suas transações comerciais internacionais.

Neste contexto, a política nacional de portos há de contemplar e priorizar novos caminhos para as cargas no território nacional. Não é sem razão que o Arco Norte, ainda embrionário, já responde por 40% da movimentação de grãos do país.

De um lado, é preciso que seja revisto o plano de desenvolvimento e zoneamento (PDZ) do Complexo Portuário de Santos para, de forma estratégica, contemplar esta nova perspectiva. De outro, é preciso construir uma nova política portuária para o país, com pelo menos quatro ou cinco portos dividindo a primazia. E a Baía de Todos os Santos, por suas condições naturais e econômicas, está disponível para assumir um destes papéis.

Tendo sido desmembrado o Ministério da Infraestrutura, os portos ficaram com o novo Ministério dos Portos e Aeroportos, e as ferrovias e rodovias com o Ministério dos Transportes. É indispensável, no entanto, que eles dialoguem e atuem de forma articulada, considerando a indispensável integração intermodal.

Assim, as novas rotas ferroviárias, que estão sendo construídas ou requalificadas, são guias essenciais para a nova política de portos, que deve olhar para o mar – promovendo dragagem de aprofundamento dos canais de acesso aos portos para atender aos navios de grande porte – e também para a terra – para enxergar a origem e o destino das cargas.

O que não pode é o Brasil perder a oportunidade de redesenhar a sua matriz logística, para suprir as necessidades de um país que cresce no agro, na mineração e quer voltar a crescer também na indústria.

O atual transbordamento das cargas de Santos para os portos mais próximos veio para ficar e está a exigir dos gestores públicos a percepção de que este é um momento que requer um novo olhar para todo o cenário nacional e suas projeções futuras, em busca do melhor para o país.

Waldeck Ornélas é especialista em planejamento urbano-regional. Autor de Cidades e Municípios: gestão e planejamento.