Cultura

Prefeitura reconhece Ilê Axê Kalé Bokun como Patrimônio Cultural

O ato solene do tombamento municipal será dia 20 de dezembro
Fundação Gregório de Mattos , Salvador | 16/12/2018 às 13:54

A Prefeitura de Salvador, através da Fundação Gregório de Mattos, reconhece o Terreiro Ile Aşé Kalè Bokùn como Patrimônio Cultural da cidade, o primeiro terreiro de Nação Ijexá tombado no Brasil. O ato solene do tombamento municipal será dia 20 de dezembro de 2018, às 17h.

Em fevereiro de 2016, a Associação Brasileira de Preservação da Cultura Afro Ameríndia – AFA, oficializou o pedido de tombamento do Terreiro na FGM.  Visando atender ao que determina a regulamentação da Lei n. 8.550/14, foi entregue notificação de abertura do processo PR FGM n. 217/16, assinada em junho do mesmo ano, pela então dirigente do culto dessa casa, a Yalorixá Estelita Lima Calmon, que, por estar em idade avançada, veio a falecer no dia seguinte, entrando o terreiro em axexê.

Em novembro de 2016, A AFA, na pessoa do seu Presidente, Leonel Monteiro, juntamente com a Egbomi Vânia Amaral, na época representante do terreiro e hoje a Yalorixá dirigente, além do professor Vilson Caetano, entregou ao Presidente e à Diretora de Patrimônio e Humanidades da FGM o Laudo Etno Histórico desse templo, de Nação Ijexá, fruto de rica pesquisa do referido professor, revelando elementos importantes acerca da presença dos africanos ijexá em Salvador, da continuidade história do templo e da sua herança ancestral, além de aspectos das edificações que o compõem e das espécies etno-botânicas que são encontradas na área de mato. Foi ainda entregue plantas baixas dos imóveis, que compõem o terreiro, e registros acerca do seu estado de conservação.

A instrução técnica do processo, que visa atender à regulamentação da Lei Municipal nº 8550/14, contou com levantamento topográfico pela SUCOP e georreferenciamento do terreno pela SEFAZ, sendo emitido parecer, com avaliação preliminar quanto ao mérito de tombamento municipal, para análise e parecer conclusivo do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural. Se observa, no Dossiê técnico da FGM entregue para relatoria do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural em julho de 2018, que, além dos imóveis, que compõem a expressão do culto afro-brasileiro, é digno de preservação o mobiliário do templo, tendo essas peças sido registradas em fichas de catalogação. Após aprovação do Conselho, em setembro do mesmo ano, foi feito o encaminhamento ao Prefeito de Salvador, que aprovou a inscrição no livro de tombamento e o título ao Ile Aşé Kalè Bokùn de Patrimônio Cultural do Município de Salvador.

Na proposta de tombamento desse Terreiro, da nação ijexá, encaminhada pelo Sr. Leonel Monteiro, Presidente da AFA, foi ressaltado que esta comunidade de terreiro preserva raro legado ancestral em vias de extinção, se constituindo “...no mais importante (talvez o único) Terreiro de Candomblé de Nação Ijexá no País”, e que preserva ainda rituais específicos, que exaltam o poder ancestral feminino, por meio do culto Geledé, além de “importante patrimônio ambiental envolvendo fonte, centenárias árvores e plantas sagradas”.

Para Tavares, “O tombamento do terreiro Ile Aşé Kalè Bokùn preserva elementos de referência da tradição Ijexa, presentes na cidade. A casa é referência da memória do Babalorixá Severiano Santana Porto, que implantou o templo no subúrbio ferroviário, nos primeiros anos do século passado, assim como daqueles que deram continuidade ao seu trabalho: Claudionor dos Santos Pereira, Estelita Lima Calmon e a atual Yalorixá Vânia Amaral, vinculando-se à história do bairro de Plataforma, um dos mais antigos de Salvador, local de grande expressão da população afro-descendente e de concentração de casas de Candomblé.”

A atual Yalorixá, Vânia Santos Amaral, declara, sob forte emoção, após fazer reverências aos ancestrais que, hoje, “podem se considerar como um espaço de terreiro que foi reconhecido pelo município como patrimônio da cidade e isso quer dizer que meu povo foi reconhecido! Reconhecidos pelas lutas que todos aqui passaram e os que aqui estão, preservando esse lugar de prática e crença religiosa. Fico feliz e renovada de fé e esperança, por mais este acontecimento, pois os meus antepassados lutaram! Lutaram! Em destaque, a minha Yalorixá, Estelita Calmon, que muito se dedicou a esse terreiro. Adupé! Adupé iyas por terem sido incansáveis para perpetuar esse Ilê Asé! Adupé, iyas, vocês foram valentes e dedicadas! Adupé, Orisás! Mojubá! Mojubá!”.

 

Salvador Memória Viva

Programa de atividades de proteção e estímulo à preservação dos bens materiais e imateriais do município, da Fundação Gregório de Mattos, Prefeitura de Salvador.

 

Lei Municipal n°. 8.550/14

Institui Normas de Proteção e Estímulo à Preservação do Patrimônio Cultural do Município de Salvador, e dá outras providências.

 

Capítulo I

 

Art. 1º O Município de Salvador protegerá o Patrimônio Cultural existente em seu território por meio dos seguintes institutos:

 

I - Tombamento;

 

II - Registro Especial do Patrimônio Imaterial.


Parágrafo Único - O patrimônio cultural, para fins de preservação, é constituído pelos bens culturais cuja proteção seja de interesse público, pelo seu reconhecimento social no conjunto das tradições passadas e contemporâneas no Município de Salvador.

Como primeira ação com base na Lei 8.550/2014, em 15 de janeiro de 2016 o conjunto monumental do Terreiro Hunkpame Savalu Vodun Zo Kwe foi tombado, diante de diversos motivos elencados no ofício de formalização do pedido de tombamento, protocolado e documentado pela Associação Brasileira de Preservação da Cultura Afro Ameríndia – AFA, como problemas com a especulação imobiliária, invasão de terreno com derrubada de árvores, dificuldade de manutenção das instalações físicas e depredação da fonte, o critério raridade do culto também foi levado em consideração, haja vista que o Vodun Zô é o único da naçãoJêje Savalu, mantendo originais os ritos dessa linhagem, bem como o dialeto africano Ewe-Fon preservado nas expressões, cânticos, rezas e no cotidiano dessa comunidade. 

Em seguida, 04 de maio de 2016, aconteceu o Tombamento da Pedra de Xangô e Área Considerada Sítio Histórico do Antigo Quilombo Buraco do Tatu, que se justificou pelo valor dos remanescentes naturais locais (massa verde e manancial hídrico), que, além de servir de moldura para a Pedra de Xangô, reserva mérito de preservação em si mesmo, como elemento de identidade cultural, também por se constituir em espaço de memória e referencial simbólico ao que se considera: ‘sítio histórico do antigo Quilombo do Buraco do Tatu’; e devido à característica peculiar da área, que serve ao culto do Candomblé, sendo apropriada pela população de Terreiros; legítimos herdeiros de saberes e fazeres, que reforçam e recriam as dinâmicas da cultura afro-brasileira nesse território, reconhecendo-o e o autenticando-o como Sagrado, conforme explicou Milena Luisa da S. Tavares, Diretora de Patrimônio e Humanidades da FGM.

A estátua de Jesus – Salvador (Cristo) na Barra, bem como do morro que lhe dá suporte foi tombado em 2017, durante as comemorações do aniversário da cidade. Diante de diversos motivos elencados no ofício de formalização do pedido de tombamento, foi levado em consideração o fato de os monumentos públicos carregarem em si a simbologia de pertencimento, valores e memória de determinado lugar ou grupo social. A Estátua de Jesus – o Salvador foi indicada por traduzir-se numa obra de caráter religioso, resguardando valores da cultura local, além de simbolismos como: bênçãos à cidade, fé cristã, proteção e paz. Outro argumento de significativa relevância está na proximidade do centenário de sua existência, o que lhe reserva mérito histórico e artístico. Integrada ao Morro, a estátua revela uma singularidade poética, como elemento de composição de uma das mais belas paisagens da cidade, conferindo-lhe título de cartão postal, e o significado desse conjunto para a “Bahia de São Salvador”, enquanto marco de importância urbanístico-paisagística reforça e enaltece a necessidade de garantir sua permanência no sítio onde se encontra.

Estão como tombamentos provisórios, em fase de instrução, a Casa de Retiro São Francisco, Brotas; a Igreja Senhor Bom Jesus dos Aflitos, no Largo dos Aflitos; a Casa onde morou Carlos Marighella, Nazaré; o Marco de Fundação da Cidade do Salvador, no Porto da Barra e 16 Obras de Carybé.

Já na esfera do Patrimônio Imaterial, o primeiro Registro Especial foi concedido ao ritmo, música e movimento do Samba Junino, que passou a ser considerado Patrimônio Cultural de Salvador, conforme Decreto 29.489/2018.