POLÊMICA SOBRE O VERDADEIRO DIA DE SÃO BOAVENTURA, p WALMIR ROSÁRIO

Walmir Rosário
17/07/2020 às 19:50
   Passei toda última terça-feira (14) em casa, acabrunhado por não ter como participar dos festejos em homenagem a São Boaventura, rever os amigos que vêm homenagear o santo em seu dia. Tudo cancelado por causa da pandemia. Minha única esperança era nesta quarta-feira (15) ir à praça da Matriz rever os católicos tradicionais que comemoram a data no seu verdadeiro dia, 15 de julho.

   Dia 14 de julho é data para se comemorar a tomada da Bastilha, marco central da Revolução Francesa, que nada tem a ver com Canavieiras, também conhecida como Canes, com um “n” só para não rivalizar com a cidade da Riviera francesa. São Boaventura era italiano e sua segunda pátria, pelo que consta nos estudos do memorialista Raimundo Tesdesco, é Canavieiras.

   Para evitar as inevitáveis (pode?) polêmicas eu fico com as duas datas: dou uma no cravo e outra na ferradura, festejando nos dias 14 e 15, além do tradicional cortejo e lavagem da escadaria da igreja. Este ano, se não fosse pelas estrepolias de Tolé, nem as escadas seriam lavadas, o que por certo seria um desgosto a mais para São Boaventura, já chateado com a mudança de datas.

   Pelo que consta, na farta documentação da Igreja Católica Apostólica Romana está registrado o dia 15 de julho de 1274 como a data de seu falecimento e não 14 como hoje festeja a igreja em Canavieiras. 

   Como não gosto de desagradar os amigos, me reúno com todos eles nas barracas montadas na praça da igreja para homenagear o santo. Comemos e bebemos de acordo com a tradição, sem qualquer atrito.

   Pelo que Tedesco me contou, essa história da data é uma questiúncula que já deu muito o que falar. Ele jura que no livro de Tombo da paróquia consta que a trezena era iniciada no dia 2 de julho – dia do Caboclo – e se estendia ao dia 15, com festas noturnas bancadas a cada dia por um grupo de devotos, que se esmeravam em promover uma mais rica que a outra, numa demonstração de poder e fazer média com o padroeiro.

   Mas num determinado ano, o padre de Belmonte reclamou com seu colega canavieirense que eles não prestigiavam a padroeira da cidade vizinha, Nossa Senhora do Carmo, Mãe de Jesus Cristo, também comemorada na mesma data. Por uma questão de hierarquia, Belmonte merecia a visita dos canavieirenses. O padre canavieirense não contou conversa e antecipou o festejo em um dia.

   No dia 15 mais de 10 canoas aportaram em Belmonte com os fiéis canavieirenses, tendo à frente o padre, pensativo com o argumento que utilizaria para acomodar os católicos tradicionais emburrados com a mudança. Rezaram, cantaram e louvor a Nossa Senhora do Carmo, e aqui chegando foi proposta uma eleição para a escolha da nova data. Os cabos eleitorais do padre foram mais convincentes e 14 de julho transformada em data oficial.

   Embora perdessem a eleição, os católicos tradicionais não se conformaram e continuaram por muitos anos comemorando São Boaventura no dia 15, até chegar ao esquecimento. Anos depois, resgatada a história, um grupo de rapazes bem-intencionados resolveram ampliar os festejos ao padroeiro por mais um dia, sob protesto dos dirigentes da igreja – padre e assessores.

   Da suntuosidade da festa do dia anterior foram abolidas as cerimônias religiosas, por motivos óbvios, o que em nada abalou a boa vontade do grupo, que se limitou ao uso de algumas ferramentas de marketing. Desprovidos de um sino, compraram 15 dúzias de foguetes e pistolões, que soltavam aos poucos para chamar a atenção da comunidade, espantada com a pirotecnia.

   Tudo foi estudado milimetricamente pelos rapazes, que no dia anterior propuseram uma parceria aos donos de duas barracas para que ficassem abertos no dia seguinte, com a promessa de alto faturamento. Além alvorada pirotécnica, que se estende por todo o dia, comem e bebem nas barracas e ainda promovem debates sobre a influência de São Boaventura na sociedade canavieirense e contabilizam a quantidade de Boinhas.

   Com essa pandemia, acabou a tradição dos católicos tradicionalistas e até algumas dos contemporâneos. E explico: Ao final da procissão, o pároco – da escadaria da Igreja – asperge água benta em carros, motos e bicicletas. 

   Para completar o ato de fé e de confiança no poder de São Boaventura, a população se dirige ao andor do Santo para retirar e guardar as folhas e flores que enfeitavam o andor. 

  Conforme reza a tradição, quem guardar uma folha ou um pedaço de flor na carteira não terá dificuldades financeiras, males e doenças. Essa parte ainda foi possível ser feita, pois a procissão foi transformada em carreata. Já nesta quarta-feira, 15 de julho, os tradicionalistas tiveram que se conformar, haja vista que a pirotecnia poderia ser realizada, menos as atividades das barracas, que tinham de ser presenciais.

  Estamos chocados com a falta dessa tecnologia para proporcionar uma homenagem tão especial.