AS MENINAS DO RELÓGIO E A BARBA DO PROFETA BELL

Tasso Franco
03/03/2011 às 13:03
Foto: Quadro de Costa Lima
Nos anos 1960, esse era o ponto de glamour do Carnaval de Salvador

    Quando eu era mais jovem, lá nos idos dos anos 1960, o ponto do glamour do Carnaval de Salvador era o Relógio de São Pedro.

    Até cunhamos uma expressão para definir esse espaço da folia, bem característica daquela época, de ir a esse sítio para paquerar as "Meninas do Relógio". Havia uma muvuca nesse quadrilátero freqüentado pelas mocinhas (ainda havia moças na Bahia) prontas à paquera, especialmente quando passava um trio elétrico, ainda com percussão produzida por músicas usando surdos, bumbos e caixas.


   Evidente que a paquera de hoje é completamente diferentes do "ficar" daquela época e, salvo melhor juízo, quem desse um beijo na boca de uma foliã, entre as "Meninas do Relógio", era mesmo que ganhar na loteria da Caixa.

   Atualmente, beijar na boca das "mocinhas" dos blocos carnavalescos é por metro quadrado, tendo folião que trava os dentes e a língua em mais de 60 ao dia.  


   Com as "Meninas do Relógio", no máximo, uma "colada" e anotar o telefone num papel porque não havia celular, marcando um provável encontro, posteriormente, na Rua Chile ou na Avenida Sete. Ainda se levava papel e caneta para o Carnaval, dois equipamentos importantes.

   Posteriormente, o ponto do Relógio de São Pedro perdeu terreno para a Praça Castro Alves, no início dos anos 1970, com a "revolução das meninas da UFBA", as quais deixaram a castidade de lado e passaram a adotar posturas mais liberais.


   Ainda assim, prevalecia o corredor Relógio de São Pedro, Beco Maria Paz (nas proximidades do Mosteiro de São Bento) e Praça Castro Alves surgindo, também, o circuito alternativo da folia no espaço à frente do Clube de Engenharia, na Carlos Gomes, que marcou época.

   Foi nesse espaço que assisti a passagem do trio elétrico com o Pombo Correio que tanto sucesso fez com Moraes Moreira. E, posteriormente, a Caetanave de Caetano Veloso.


   Era a época do Carnaval sem cordas, folia geral, irreverente, até que se iniciaram as mudanças com os blocos de índios e outros, e uma invasão da violência que mudou para sempre os festejos a momo.

   A Praça Castro Alves e o Clube de Engenharia ainda resistiram até os anos 1980, mas, sucumbiram aos "novos tempos", do Carnaval segregado em cordas, dos carnês dos blocos, do marketing e dos produtos, e do circuito Barra/Ondina.


   Na época das "Meninas do Relógio" ainda existiam os bailes nos clubes, especialmente no trio da Barra (AAB, Iate e Bahiano de Tênis), o baile das Atrizes, o Baile dos Casados do Botafogo e o fim da era do Fantoches da Euterpe.

   O Carnaval tinha dois tempos: na rua, até determinada hora; e nos clubes, a partir da meia noite até o amanhecer.


   Hoje, a festa camarotizou de tal forma, que perdeu todo esse encanto para dar lugar ao "ficar" e beijar, ao marketing e à venda de produtos. Pelas barbas do profeta, até o rei da axé Bell Marques caiu nessa vendendo a sua.