O ESTATUTO DAS FAMÍLIAS

Sérgio Barradas Carneiro
19/02/2011 às 08:01

Foto: DIV
O Direito da Família e os ganhos postos no novo Estatuto da Família
  Partiu do IBDFAM - Instituto Brasileiro de Direito de Família - uma entidade com 13 anos de existência, a qual sou filiado e que reúne 5 mil militantes desta área, dentre os quais professores, defensores públicos, promotores, advogados, juízes e desembargadores, a ideia de oferecer ao Brasil a modernização da legislação sobre este ramo do Direito.

  Todas as seções estaduais do IBDFAM foram acionadas para a elaboração do Estatuto das Famílias. Cada uma ficou responsável por uma parte. O anteprojeto foi disponibilizado no site do Instituto para recebimento de críticas e sugestões, não apenas dos associados, mas de qualquer pessoa, após o que foram feitos os ajustes necessários à versão final que foi novamente disponibilizada no site.

  Ao receber o projeto, nova revisão foi feita pela assessoria da Câmara dos Deputados. Depois de protocolado por mim na Câmara, o projeto foi enviado para a Comissão de Seguridade Social e Família para análise de mérito. Lá, foi aprovado por unanimidade, tendo sido retiradas todas as referências às relações homoafetivas.  

  Na Comissão seguinte, de Constituição, Justiça e Cidadania, o projeto foi debatido em audiência pública, recebeu pedido de vistas de diversos parlamentares, foram apresentados votos em separado, o então relator e presidente da Comissão, deputado Elizeu Padilha (PMDB/RS) ouviu e acatou diversas sugestões e, finalmente, após duas semanas de adiamento e três anos e meio de tramitação, o projeto foi votado em dezembro do ano passado.  

  Com 264 artigos, o Estatuto das Famílias contém uma parte relativa ao direito material, que reproduz os conhecidos institutos do Direito de Família : o casamento - com todos os seus efeitos, impedimentos, regimes de bens, validade e provas -, além de outros institutos, tais como a união estável, o divórcio, a tutela, a curatela, guarda, adoção, alimentos, etc.

   Elimina o nunca usado regime de bens dos aquestos (adquiridos na vigência do matrimônio). O grande avanço do Estatuto, entretanto, verifica-se na criação de uma processualística própria do Direito de Família. A partir do Título VII, passamos a ter regras do Processo e do Procedimento.

  A conciliação é estimulada, permeando todas as fases do processo e também é reconhecida a interdisciplinaridade do Direito de Família. É eliminado o instituto da separação, não mais recepcionado por nossa Constituição, conforme vários julgados, posteriores à promulgação da Emenda 66/2010, também de minha autoria, e que instituiu o divórcio direto no País.  

   O projeto cria ainda o Cadastro de Proteção ao Credor de Alimentos para as pensões não pagas, sem prejuízo de inscrição em outros cadastros das demais instituições públicas ou privadas de proteção ao crédito, instituindo uma etapa anterior ao pedido de prisão do devedor da pensão alimentícia. Também inova quanto chega a esta medida extrema, ao estabelecer o regime semiaberto, a fim de que o devedor possa via bilizar o pagamento das prestações vencidas. Somente em caso de descumprimento ou deboche da ordem judicial, chega-se ao regime fechado.  

  Apesar da sua importância sob vários aspectos, a imprensa tem insistido num item que não consta do mesmo: o de benefícios para "amantes".

  Um jornal de grande circulação, ao fazer a cobertura do projeto, apesar da correta reportagem da jornalista, pecou no título ao informar que o mesmo permitiria o pagamento de pensão para amantes.

  Isso não é verdade. Relação com amante não gera efeito jurídico, pois não tem o animus da procriação, de constituir patrimônio em comum, nem de formar uma família. Assemelha-se a uma relação de namoro havida entre pessoas no ambiente de trabalho, de estudos, na academia ou na vizinhança, em que uma delas não é desimpedida legalmente, o que difere totalmente da união estável.  

  No capítulo referente à União Estável, com as condições qualificadoras de tal situação, quais sejam a relação pública, duradoura e estável, está dito que se uma das pessoas estiver em desacordo com a lei, a outra não pode pagar por este erro, sendo devida à assistência se necessário. É óbvio que a regra não é esta.
 
  Quem quer mudar de parceiro deve primeiro desfazer o vínculo matrimonial e, por isso, lutamos e aprovamos a Emenda 66, do divórcio. Entretanto, se, à exceção, alguém mantém duplo relacionamento, um de fato e outro de direito, tem que ser responsabilizado por tal atitude, o que é diferente de dizer que o projeto incentiva a prática do adultério ou da bigamia.

O que está posto no texto é o que a jurisprudência tem consagrado. Só isso.   Nesse sentido, o IBDFAM reproduziu esta semana, em seu boletim online, vídeo de programa Revista, da TV Record de Cuiabá (MT), veiculado em 5 de fevereiro, que trata justamente do Estatuto das Famílias.

  No programa, o advogado e presidente do IBDFAM/MT, Naime Márcio Martins Moraes, e a pesquisadora do Núcleo de Estudos sobre a Mulher e as Relações de Gênero da Universidade Federal do Mato Grosso (NUEPOM/UFMT), Vera Bertolini, esclarecem muitos pontos do projeto e consideram que a proposta traz à tona uma discussão "necessária e tardia", pois trata de uma discussão sobre direitos.  

  O projeto seria terminativo na Comissão de Constituição e Justiça. Mas, infelizmente - do ponto de vista da tramitação, que será mais demorada -, mas democraticamente, alguns parlamentares opostos ao projeto entraram com recursos, o que fará com que o Estatuto seja apreciado, também, no plenário da Câmara para, só então, seguir para o Senado. 

  Vamos recomeçar (ou melhor, continuar) com nossa defesa da modernização do Direito de Família e pela aprovação do Estatuto das Famílias. O debate é bom e importante. E, se razoáveis forem os argumentos, podem e devem ser absorvidos sem a necessidade de condenação de uma grande ideia.
 
Sérgio Barradas Carneiro
Advogado e deputado federal pelo PT-BA
 
 
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