RESPEITO NOCAUTEADO EM EVENTO DE ARTES MARCIAIS

Irlã Andrade
01/05/2010 às 10:21

Foto: EFE
A luta tem códigos que devem ser respeitados pelos atletas
 

Abu Dhabi, 10 de abril de 2010. Acontece a 112ª edição do Ultimate Fighting Championship (UFC), o maior evento de artes marciais do mundo. A platéia - composta por admiradores, jornalistas e empresários - aguardava euforicamente ao combate principal, entre os brasileiros Anderson Silva e Demian Maia, travado dentro de uma arena. Na luta, estava em jogo o cinturão do peso médio e, sobretudo, o interesse empresarial do UFC em satisfazer a expectativa da mídia internacional, bem como dos investidores do evento.


O combate poderia ser um excelente espetáculo de técnicas marciais, se não fosse a presença de um fator inusitado: a "personificação" do deboche e desrespeito, encarnado por Anderson durante o combate. O comportamento desrespeitoso do lutador repercutiu negativamente na mídia internacional, inclusive na brasileira. Órgãos noticiosos como TV CNN, TV Globo, jornal Le Monde, jornal do Brasil, jornal O Globo, sites UOL e Yahoo, dentre outros, deram visibilidade mais que o normal ao caso.


Quem pratica artes marciais sabe que o "respeito acima de tudo" deve ser um princípio norteador na vida do atleta. Trata-se de um valor imprescindível para o lutador, estando ele dentro ou fora da arena de combate. É inadmissível que o atleta renuncie ao respeito em favor da vingança ou da raiva, deixando-se entorpecer pelo excesso de zombaria perante o adversário.

Foi o caso de Anderson Silva. Ele teve 93% dos votos na enquete feita pelo site do UFC, o que revelou o seu favoritismo ante à opinião pública. De fato, o resultado final da luta corroborou o pensamento do público de que Demian não conseguiria derrotá-lo.


Entretanto, o que mais chamou a atenção da mídia não foi o combate em si, mas a maneira como Anderson se comportou nele. Xingamentos e posturas pejorativas foram os seus principais ataques. O show que todos aguardavam e os seus golpes notoriamente espetaculares praticamente não houve.

Segundo a imprensa norte-americana, a expectativa do público era que houvesse o nocaute. Mas quem assistiu ao combate viu que o único nocauteado foi o princípio do "respeito acima de tudo". Após o confronto, o campeão se retratou, mas não o suficiente para compadecer o público.


Numa entrevista realizada durante o programa Domingão do Faustão, o campeão do peso médio, visivelmente nervoso, haja vista o suor no seu buço, foi colocado lado a lado com Demian. Na ocasião, foi dito a Anderson que a direção do UFC cogitou uma possível demissão ou rebaixamento do mesmo ao "card preliminar", onde os lutadores são menos conhecidos e ganham bolsas menores.


Decerto, a provocação existe no ambiente esportivo. Muitos a fazem como uma estratégia psicológica para desestabilizar ou amedrontar o oponente. Porém, a grande questão é o nível da provocação e a sua ausência de limites. Ela se torna vulgar na medida em que extrapola as fronteiras do respeito ao adversário e à arte marcial representada pelo provocador. Ademais, vale notar que ao redor da "figura do campeão" sempre existe uma legião de admiradores e fãs que o tomam como referencial, em virtude do seu notório sucesso. Todavia, quando essa boa referência incorre em graves deslizes, abre-se espaço para máculas na sua imagem que, a depender da gravidade do erro, são julgadas de maneira inexorável pela mídia e pelo público.


Agora, praticantes, pesquisadores e admiradores das artes marciais esperam uma reflexão por parte de Anderson Silva que já faturou altas cifras no UFC. Contudo, ele tem que entender que isso não lhe confere o direito de fazer o que fez. Tal fato pode até repercutir negativamente nas empresas que têm suas marcas vinculadas a esse atleta. O capitalismo é selvagem. Dana White, dono do UFC, que o diga.