RÔMULO ALMEIDA, O CONSTRUTOR DE SONHOS - II

Antonio Jorge Moura
22/06/2009 às 10:01

Foto: Arquivo
Rômulo Almeida e sua influência desde a era Getúlio Vargas
  A sede do antigo MDB, o partido da oposição ao regime militar e da redemocratização do Brasil funcionava no Campo Grande, primeiro andar de um sobrado por trás do Hotel da Bahia vizinho da então Reitoria da UCSAL, que dava seus passos afirmativos na vida acadêmica baiana.

  Foi dali que saiu famosa fotografia daqueles tempos ainda heróicos, dos cães da PM fustigando Rômulo Almeida, Ulysses Guimarães e Tancredo Neves após a realização de comício pela democracia no Campo Grande, em frente ao Teatro Castro Alves, que não fora autorizado pelas autoridades militares.

  O governador da época era o professor Roberto Santos, filho do fundador da Universidade Federal da Bahia, reitor Edgard Santos, um democrata que não teve como impedir que a PM fosse chamada às ruas para reprimir a manifestação política. Esse episódio histórico não o impediu, anos depois, na reorganização partidária no Brasil, Roberto Santos de fundar na Bahia o Partido Popular (PP) criado por Tancredo Neves e fundí-lo com o histórico MDB.

   O PP e o MDB se fundiram no início dos anos 80 para Formar o PMDB e Roberto Santos acabou candidato da oposição a Governador da Bahia na primeira eleição direta pós-64. Rômulo Almeida foi o candidato a Vice-Governador e Waldir Pires, que antes vivia no Rio de Janeiro e lá tornou-se o empresário da construção civil que forneceu as pedras para a expansão imobiliária da Barra da Tijuca foi o candidato ao Senado.

  A primeira experiência de fôlego do MDB em campanhas eleitorais foi em 1976, na campanha ao Senado, na qual os candidatos foram Clémens Sampaio, que tinha fama de adesista, e o autêntico Rômulo Almeida. O partido de oposição não tinha mais do que 60 diretórios municipais num estado que somava 336 municípios.

  Dizia-se que dr. Rômulo havia "calçado a sandália de pescador" para percorrer a Bahia essa empreitada política de resistência democrática. A campanha reuniu algumas das mais brilhantes cabeças da juventude baiana de então e o comitê foi instalado num casarão do Largo Dois de Julho.

   Edson Barbosa, jornalista e publicitário que foi assessor da campanha, inclusive locutor dos comícios, está aí para comprovar como se deram aqueles anos heróicos. Eduardo Saphira também. Rômulo fez pouquíssimos comícios no interior do estado, mas naquele de encerramento da campanha, no Largo dos Mares, na Cidade Baixa, a oposição mostrou a força que tinha: reuniu menos de 100 pessoas, a maioria militantes de partidos clandestinos de esquerda que sobreviviam dentro do MDB.

   Os tempos eram de medo e até as manifestações políticas legais eram evitadas. Na cabeça da população ainda estava os confrontos do governo e da guerrilha urbana. A campanha de Rômulo ao Senado deu fôlego às forças autênticas e aos partidos de esquerda abrigados no MDB, entre eles os históricos PCB, PCdoB. a AP e a Esquerda Democrática, além dos remanescentes da luta armada, que depois deram origem do atual PT. Os chamados adesistas e colaboracionistas do regime militar acabaram afastados.

  A incorporação do PP fortaleceu, deu musculatura ao MDB, sobretudo no interior do estado, para enfrentar a campanha de 1982. Para viabilizar a campanha Rômulo Almeida abriu mão da candidatura a governador em prol de Roberto Santos, ocupou a vaga de Vice-Governador e a vaga para o Senado foi ocupada por Waldir Pires, que já havia retornado à Bahia após o exílio na França e readquirido os direitos políticos cassados em 1964.

   Após a convenção partidária fui convidado por Genebaldo Correia para assessor da campanha de Roberto Santos e chamei Milton Mendes Filho para fotógrafo. Não havia internet e a transmissão de matérias era feita por telefone para os jornalistas políticos dos jornais. Não tinha imagem de TV.

  De oito em oito dias Miltinho repassava algumas imagens fotográficas. Passávamos por quatro a seis cidades por dia realizando comícios até ao meio-dia, debaixo do maior sol, e sempre encerrávamos à noite num município de maior representação eleitoral, onde a comitiva dormia. No final de cada dia me apossava do telefone público no posto da Telebahia para repassar as notícias e o conteúdo dos discursos às redações.

   Percorremos mais de 250 dos 336 municípios do estado em três meses de campanha. Uma tarde, princípio da noite, estávamos em Feira de Santana para um comício de Luciano Ribeiro e liguei para Vitor Hugo Soares, que fora meu chefe de redação na Sucursal do Jornal do Brasil. Ele me deu a notícia fatídica; Clériston Andrade, candidato do PDS, havia morrido naquela tarde num acidente de helicóptero na região de Itapetinga. Junto com outros políticos governistas.

  Voltei ao palanque onde estava o comando da campanha de dr. Roberto e ninguém acreditou na informação. Então, desceu comigo um grupo em que estava Archimedes Pedreira Franco e Galdino Leite para ir ao posto telefônico. Lá ligaram para Salvador e tiveram a confirmação da notícia que dei. Voltaram ao palanque e foi decidido suspender o comício. Quando a notícia foi dada pelo sistema de som a platéia ignara chegou a aplaudir.

   Todo comando foi para o Hotel Flexa, na estrada, para se reunir e tomar decisões. Ficou acertado suspender a campanha por três dias sinal de luto. Entre os oposicionistas estava Mário Kertész, que foi prefeito de Salvador e rompera com as forças governistas. O único peemedebista que teve a grandeza de ir ao sepultamento do corpo de Clériston, no Cemitério do Campo Santo, foi dr. Rômulo Almeida, presidente do PMDB, que levou suas condolências à família e na cerimônia manteve uma distância séria e respeitosa dos adversários políticos enlutados.

  Dr. Roberto fez a campanha em todo estado com ajuda do um avião bimotor emprestado pelo pecuarista Coriolano, de Itapetinga, amigo de Michel Hage, sempre conduzido pelo piloto Nelson. Uma das poltronas do bimotor era cativa de D. Maria Amélia Santos. A coordenação era de Paulo Segundo da Rocha. Dr. Rômulo fez uma campanha paralela nos municípios que dr. Roberto não visitou, sempre acompanhado por alguns integrantes do Grupo Autêntico.

   Para empreitada, ele me pediu que indicasse um jornalista. O indicado foi o jornalista mineiro Dalton Godinho. O comício de encerramento foi no Campo Grande e conseguiu reunir mais de 50 mil pessoas, um fenômeno de massas na época. Depois uma carreata encerrou a caminhada peemedebistaa na Igreja do Bonfim. Lá, no alto da Colina Sagrada, dr. Rômulo colocou a mão em meu umbro e disse: - A oposição deve isso à seriedade do jornalismo baiano, especialmente a você.

  O pleito foi vencido pelo candidato que substituiu Clériston Andrade na primeira eleição direta para governador pós-1964, atual senador João Durval Carneiro. Um estudo estatístico e político feito pelo economista e professor da UFBA Aristeu Almeida afirma que as eleições foram fraudadas porque constou dos boletins do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) mais eleitores do que a população baiana na época poderia comportar. Oficialmente nenhuma fraude foi comprovada, mas o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) determinou o realistamento do eleitorado baiano.