A VELHA CIDADE DA BAHIA DA ÉPOCA DO JERERÉ

Antonio Jorge Moura
28/05/2009 às 12:09
Foto: apenasbaiha.blogger.com.br
Representação da felicidade na Cidade do Salvador da Bahia
   A violência urbana tornou a vida perigosa e retirou das ruas nas noites da Salvador de hoje mais do que o movimento de pessoas. Substituiu a boemia pelo banditismo e pelo vai-e-vem dos catadores de lixo reciclável e moradores de rua.

  Transformou a cidade numa grande invasão urbana de barracos improvisados em espaços públicos. Jogou no desemprego centenas cozinheiras de mão cheira e bons garçons.

  A violência afetou diretamente a cultura dos restaurantes, bares e points de encontros de amigos que se tornaram célebres na vida de uma cidade legal, pacata, boa de se viver e generosa com os visitantes. Como éramos no passado.

   Ninguém de bom senso arrisca na Salvador de hoje a dar uma passada num bar/restaurante como o Jereré, que funcionou até os anos 1980 no Largo de Amaralina. Ir às 2hs da madrugada e ficar com os amigos tomando cerveja para assistir ao sol nascer. E só se retirar para dormir às 8hs quando os normais já estão no trabalho ou se dirigindo para pegar o batente.

  Na casa onde funcionou o Jereré tem agora uma loja de material para limpeza e piscina. Para que as novas gerações não duvidem é preciso afirmar que esse lugar existiu mesmo em Salvador. O Jereré era também ponto de encontro dos jogadores de baba que jogavam bola até a madrugada nas quadras de futebol da Boca do Rio.

   Era aquele restaurante aberto para os famintos que levantavam da cama de madrugada para matar a fome com um filé a permagiana acompanhado de arroz branco e purê de batata. Que delícia!

  Os mais saudosistas, como meu amigo e publicitário Mário Pontes, vai mais fundo e sente nas narinas o perfume da Feijoada do Biu que era servida no velho e tradicional Mercado Modelo, aquele que pegou fogo, na Rampa do Mercado. Biu saiu de lá com as cinzas do mercado e reabriu no Largo das Flores, perto do Moreira, e depois foi para Rua do Cabeça. 

  Os estudantes da Faculdade de Economia da UFBA, do Largo da Piedade, eram viciados em beber umas cervejinha no bar do Clube Comercial, ali na Avenida Sete, quase defronte da Igreja de Nossa Senhora do Rosário - não confundir com a Rosário dos Pretos, no Pelourinho -, e depois dar uma esticada no Biu, onde as madrugadas levadas a feijoada são inesquecíveis.

  E hoje, quem faz programa etílico-gastronômico na Carlos Gomes? Quem arrisca comer uma feijoada de madrugada no tabuleiro que Alaíde do Feijão, antes dela se estabelecer na vizinhança da Igreja da Ordem Terceira de São Francisco, na parte de cima da Ladeira do Pax?

  A feijoada era servida aos notívagos e vagabundos num dos passeios do Largo do Tesouro, pertinho do Bilhar do Abel e de onde a turma do compositor José Carlos Capinam e do causídico Carlos Marighella Filho - exatamente, filho do velho ex-deputado constituinte Carlos Marighella - prepara para a Bahia do futuro o Museu Nacional da Cultura Afrobrasileira.

  A última vez que fui no tabuleiro de Alaíde estava com o jornalista Machado, irmão do jornalista Béu, aquele mesmo que montou uma creche com a mulher Neném na Boca do Rio. E que me levou uma vez na casa-comunitária que os Novos Baianos tiveram na Boca do Rio, onde me serviram, dizendo que era vitamina de banana com leite, uma mistura batida do liquidificador que continha cogumelos alucinogénicos.

  Naqueles tempos da Boca do Rio de Aloísio da barraca de praia e onde se podia encontrar uma "nega" nas dunas atrás das quadras sem risco de ser assaltado. Mas, voltando ao saudosismo de Mário Pontes me lembro dos carnavais da Pastelaria Triunfo, na Praça Municipal, onde hoje funciona uma agência do Bradesco, na esquina do lado do Paço Municipal, defronte do Cemitério de Sucupira. E

  m cima de onde foi montada a sede pré-moldada da Prefeitura de Salvador, o Palácio Thomé de Souza. Para não perder o traçado urbano avisto defronte da agencia bancária a Sorveteria Cubana, na parte alta do Elevador Lacerda, que deveria ser tombada pela patrimônio histórico para não ser vendida e trocada pela marca MacDonald. S

   igo pela Rua Chile do Magazine Duas Américas, que pegou fogo, passo pela estátua do poeta Castro Alves e vou ao Restaurante Faleiro, comer sua famosa carne do sol com pirão de leite. Mário Pontes insiste e marco com ele para almoçar dia seguinte no Restaurante A Portuguesa, de Dona Carminha que fez fama na Barra antes de se instalar na Avenida Sete, perto das Mercês. Antes de comer o tradicional Bacalhau a Gomes de Só sou servido de caldo verde com fatias de pão cacetinho.

  Mário não resiste ao Ristorante Casa D'Itália, dos velhos Vicenzo Talento e Francisco Puonzo, e quer matar a saudade do bar Quintal do Raso da Catarina, de Franco, depois da entrada do Passeio Público. O bicho ainda quer passar no Chez Boullion, na Ladeira da Barra, vizinho à entrada de cima do Iacht Clube, no Chez Suzane e no dia seguinte comer o Bacalhau do Firmino, no Cabula, vizinho do Hospital Roberto Santos.
 
  Ufa! Só escrevo outro capítulo depois da digestão.