RAPOSA DO SOL DEFINE DESTINO DOS POVOS INDÍGENAS

Yulo Oiticica
11/12/2008 às 20:20
Foto: Divulgação
Povo indígena Hã Hã Hãe habitante das terras do Sul da Bahia
  No século passado, Albert Einstein formulou a teoria da relatividade; Santos Dumont sobrevoou Paris com o 14 Bis; Keynes defendeu a intervenção do Estado na economia; James Watson e Francis Crick decifraram a estrutura do DNA; é criada a internet; e descoberto o buraco na camada de ozônio sobre a Antártica. Mas, para nós, a maior invenção do século XX é a Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada por unanimidade pela Assembléia Geral da ONU, em 10 de dezembro de 1948.

  Trata-se de uma invenção verdadeiramente humana, porque é multicultural e universal, que representa um enorme passo no crescimento moral da humanidade. Hoje, 60 anos depois de proclamada a Declaração, uma decisão do Superior Tribunal Federal (STF) sobre a demarcação da reserva Raposa Serra do Sol pode definir o destino dos povos indígenas em nosso país. Caberá à corte confirmar ou não a demarcação em faixa contínua da reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima, tal como homologada pelo presidente Lula.


  A resolução da demarcação indígena no norte do país irá abrir um precedente a ação que pede a nulidade dos títulos de propriedade concedidos a ocupantes da terra indígena Caramuru-Catarina Paraguassu, do povo Pataxó Hã Hã Hãe, no sul da Bahia.

  Os casos não são semelhantes, mas, sabemos o quanto este julgamento pode influenciar posteriormente, porque o que está em jogo na verdade é a garantia dos respeitos às diferenças e as minorias. Se o STF decidir por uma demarcação descontínua será aberta uma brecha, não importando o que diga a Constituição Brasileira que completa 20 anos, para se reverem terras indígenas já demarcadas e homologadas.

  A abertura de brechas em legislações que reconhecem direitos indígenas é um procedimento tradicional no País, desde o século 16. Por essas brechas quase se conseguiu extinguir os índios no Brasil.


  O sociólogo português Boaventura de Souza Santos, diz que "temos o direito a sermos iguais quando a diferença nos inferioriza e temos o direito a sermos diferentes quando a igualdade nos descaracteriza". Portanto, as pessoas querem ser iguais, mas querem que suas diferenças sejam respeitadas.

  Ou seja, querem participar, mas querem também que suas diferenças sejam reconhecidas e respeitadas. As terras e as sociedades indígenas são preciosas para o mundo por serem modelos de uso, de sociabilidade e de visões de mundo diferentes. São um reservatório de soluções, de outras formas humanas de se viver.

  Além disso, a alternativa não é entre terras indígenas e expansão agrícola: há na Amazônia terras já infelizmente degradadas por madeireiros, pecuaristas e agricultores cuja recuperação seria suficiente para o aumento da agricultura. É esse o caminho do presente, que preserva a justiça e o meio ambiente. E essas áreas prestam serviços extraordinários à exploração sustentável do entorno.


  O professor Darcy Ribeiro dedicou a vida pela preservação da civilização indígena. Deixou o registro histórico que sintetiza a maior invenção da humanidade baseada na solidariedade, na integridade e no desenvolvimento da humanidade. Os povos-testemunhas de Darcy Ribeiro, também são povos-profecia, memória do nosso futuro. Sem eles, como diria D. Pedro Casaldáliga, "não seremos nós". Não seremos inventados.


Aos primeiros habitantes dessa terra Brasil, vítimas dos brancos senhores, e hoje reduzidos a 0,2% da população brasileira, só resta um alento, justiça, justiça, justiça.