Literatura
Rosa de Lima
12/10/2024 às  17:14

ROSA DE LIMA COMENTA MATRIZES DO PENSAMENTO PSICOLÓGICO, LC FIGUEIREDO

A diversidade, portanto, não significou um obstáculo. Pelo contrário, todas as matrizes do pensamento psicológico são contemporâneas.


   A psicologia é uma ciência nova com pouco mais de um século num mundo habitado pelo ‘sapiens’ organizado há 10 mil anos e, no decorrer deste século, se sucedem estudos e interpretações se, de fato, a psicologia é uma “verdadeira ciência” desde os experimentos do médico e psicólogo alemão Wilhelnm Wundt, na Universidade de Leipzig desde quando publicou “Princípios de Psicologia Fisiológica”, em 1873, demarcando o novo domínio dessa ciência.

   Novos estudos e pesquisas se seguiram desde Wundt sobretudo na primeira quadra do século XX, com Sigmund Freud e outros dando suporte a psicologia como ciência, porém, o debate segue com frequência diante daqueles que advogam que a psicologia é um fenômeno socio cultural agregado a medicina e sem essa característica de ciência pura.

  Eis, pois, a tarefa a que se propôs o psicanalista e professor da USP  Luís Cláudio Figueiredo quando decidiu publicar “Matrizes do Pensamento Psicológico” (Editora Vozes, primeira edição em 1991, atualmente na 20ª edição, 221 páginas, R$50,00 nos portais da internet) e dizemos que obteve êxito pleno uma vez que seu livro representa uma cartilha para amantes da psicologia, com sugestões e análises de todos movimentos históricos que surgiram e estão em permanente evolução e multiplicação no quadro geral da psicologia.

   Não é à toa que se diz haver ‘psicologias’ e não apenas psicologia dada a quantidade de alternativas clínicas que são utilizadas nesta ciência no tratamento de pacientes ou melhor dizendo na compreensão do como agem e se comportaram esses pacientes. Luís Cláudio Figueiredo tem várias publicações nesse campo e no trabalho em foco sugere ideias acerca do fazer psicologia uma ciência independente e enfoca as posturas alternativas em suas articulações com esse projeto.

   Diria que é um livro técnico se olharmos nessa direção e tem, de fato, muitos conceitos e observações no campo específico da psicóloga, porém, nada impede que um leitor com certo grau de conhecimento sobre a sociologia e a antropologia possa lê-lo. O autor usa uma linguagem que é entendível, bem diferente, por exemplo de ler Henri Bergson ou B.F. Skinner, estes sim livros bem especializados e próprios para estudiosos da psicologia e profissionais que atuam nesse campo profissional. 

   Figueiredo nos oferece um corolário de observações desde a constituição do espaço psicológico e sua ocupação, as matrizes nomotética e quantificadora; atomista e mecanicista; funcionalista e organicista na psicologia americana; funcionalista e organicista na psicologia europeia, na psicanálise e na psicossociologia, as submatrizes ambientalista e nativista; as matrizes vitalista e naturalista; o historicismo ideológico e seus impasses; as matrizes compreensivas e os estruturalistas; fenomenológica e existencialista; e faz considerações finais.

  Aparentemente, o que se lê acima parece assustador e até desmotivador para comprar e ler este livro, mas, na medida em que o leitor vai avançando nas páginas consegue entender o palavreado usado por Figueiredo, a pluralidade de enfoques e comentários abalizados com citações de autores, o que, é valioso para os estudiosos da psicologia que têm, em mãos, uma farta bibliografia para se aprimorarem nessa matéria.

   Figueiredo conceitua que “a diversidade chama a atenção em dois aspectos: em primeiro lugar, não se observou ao longo do século XX – que viu o nascimento e a consolidação do projeto de uma psicologia como ciência independente – um processo progressivo de diferenciação interna, ou seja, a diversidade não foi se acentuando, o que, se tivesse ocorrido, poderia favorecer a interpretação desse fenômeno como uma ‘crise de crescimento’, provavelmente transitória”.

   A diversidade, portanto, não significou um obstáculo. Pelo contrário, todas as matrizes do pensamento psicológico são contemporâneas. “O que se pode observar – conceitua Figueiredo – e que na falta de perspectiva adequada pode aparecer, momentaneamente, como uma diferenciação progressiva ou “evolução” – são as oscilações que ora colocam um ora outro modelo de inteligibilidade na moda, sem, contudo, eliminar ou mesmo reduzir a produtividade dos modelos alternativos”.

   E o segundo aspecto destacado por Figueiredo é a persistência da diversidade. “Não faltaram autores que, embora reconhecessem a diversidade original, eram (e são) otimistas quanto às possibilidades futuras de unificação”. O que, convenhamos, se apresenta improvável.

  Veja o que diz Figueiredo no final do seu livro: “Quando trazemos um aluno para o terreno pantanoso da psicologia deveríamos assumir a responsabilidade de propiciar-lhe as condições de exercer a crítica racional diante das alternativas que lhes abrimos e dos impasses com que o defrontamos. Não se deve esquecer que um dos mecanismos de defesa contra a incerteza é o dogmatismo, e não é à toa que entre os psicólogos campeiam, lado a lado, o ecletismo pragmático agnóstico e o dogmatismo acrítico e irracionalista”.

   “Matrizes do pensamento psicológico” é um básico com excelente conteúdo para se entender, um pouco, o mundo da psicologia cujos alicerces foram estabelecidos por autores e cientistas europeus e norte-americanos.


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