Literatura
Rosa de Lima
14/08/2017 às
11:30
ROSA DE LIMA comenta sobre livro "Quatro Vidas de Cachorro". Delicia.
Livro superinteressante para todas as idades e sobretudo para quem curte cães e cadelas
Livros sobre vida de cães associada a de humanos existem aos montes. Eu mesma li vários deles e sempre que surge um novo produto nessa linha no mercado livreiro fico curiosa e adquiro. Eu e milhares de pessoas em todo mundo. Milhões, diria.
O cachorro foi o primeiro animal domesticado pelo sapiens há milhões de anos quando ainda o homem era um caçador coletor e vivia nas savanas da África e nas partes geladas do hemisfério Norte. Daí que a relação sapiens/cachorro é a mais antiga da humanidade e, por isso mesmo, a que mais rende produções literárias e cinematográficas.
É um fascínio. E, para reforçar esse estigma, enaltece-se que o cachorro é o melhor amigo do homem. O saudoso poeta Vinicius de Moraes parodiava que o "uisque era o melhor amigo do homem; o cachorro engarrafado".
O livro de W. Bruce Cameron, "Quatro Vidas de Cachorro", editado no Brasil pela Casa dos Livros Editora (285 páginas, HCB, Rio, 2017, R$45,00) é a novidade atual nas livrarias (entre os mais vendidos nas listas dos jornais e revistas nacionais) e um dos mais interessantes que já li. O autor utiliza os cães como personagens falantes da história, o que torna a obra mais atraente para os leitores, diferenciada.
Autor best-seller do NYT e residente na Califórnia, Cameron diz que todo cachorro existe por uma razão e ele procura mostrar isso no livro, dando vida aos cães e revelando como eles nos veem (os humanos), o nosso modo de viver e encará-los. Tudo isso com doses de humor e filosofia. Além, óbvio, de uma narrativa agradável, com parágrafos curtos e texto leve.
Ou seja, o autor em vez de expressar os sentimentos dos humanos pelos cães faz o inverso e coloca na boca dos cães como eles participam do universo humano e vão descobrindo com o passar dos anos e a vivência com familias a psicologia humana, a forma de viver, alimentos, cenários, conflitos, dramas, a convivência com outros animais e até sentimentos.
O livro é agradável de ser lido justamente porque traz essa surpresa para o leitor desde o inicio da trama quando um grupo de cães de uma mesma 'familia' é capturado por homens da carrocinha e levados para um canil público. A narrativa feita pelo autor é preciosa, detalhista, e pega o leitor de surpresa, pois, é um dos cães dessa troupe que conta como foram pegos pelos homens uniformizados de marrom, levados para um veículo - diz que adorou a viagem no caminhão, a primeira de sua vida - e as novas relações que essa familia canina vai ter no canil com desconhecidos.
O subtitulo de marketing do livro é - Todo Cachorro existe por uma razão - e o autor, até para conduzir o leitor ao seu ambiente no mundo dos cães, na adoção de uma familia por um cachorro, conduz a história na relação do cão Bailey com o jovem Ethan, representante de uma familia classe média norte americana, como milhões de outras nos EUA e no mundo, que adotam cães como se fossem filhos ou mais um filho.
E essa relação da criança com o animal é muito forte, visceral, de uma amizade a cada dia mais profunda e que envolve toda a familia. Mas, no particular, o entendimento maior se passa entre a criança e o cão, Bailey deixando claro que seu amor pelo jovem é profundo e ele faz tudo para agradá-lo. Há um episódio estimulante dessa amizade em que Bailey salva-o da morte durante um incêndio que aconteceu na sua residência.
Parece-nos claro que para ambientar essa relação num livro de quase 300 páginas o autor recorre a narrativa do dia-a-dia familia, as temporadas inverno/verão, os costumes, os mitos, os desejos, as viagens e tudo o que envolve um lar - o trabalho, a escola, as férias, os passeios, as tragédias assim por diante.
Tudo isso narrado pela ótica do animal. Diz Bailey: "Acho que jamais me dei ao trabalho de imaginar que pudessem existir meninos, mas agora que encontrei um, achei que esse era, simplemente, o conceito mais maravilhoso do mundo. Ele cheirava a lama e açúcar e a um anaimal que jamais farejara antes. Dava para sentir um leve odor nos seus dedos, e eu os lambi". Essa é a narrativa do primeiro encontro entre ambos.
O livro é recheado dessas tiradas, de um relacionamento tão estreito que Bailey opina sobre os amigos de Ethan, os país, as namoradas, as disputas colegiais, integrado perfeitamente ao lar. E o jovem entende o cão como uma figura essencial em sua vida e sente falta dele quando por algum motivo Bailey dá escapulidas pelas ruas do bairro onde eles vivem.
A passagem da primeira visita da familia a uma fazenda dos avós de Ethan é muito criativa. A maneira como o cão encara Frale, um cavalo montado pelo menos, um coelho e uma cobra animais até então desconhecidos do seu mundo.
"Não me agradava o fato de Flare atrair toda a atenção e de me ver tão distante do menino, obrigado a andar ao lado daquela criatura enorme, que eu já concluíra ser mais burra que os patos. Fiquei particularmente aborrecido quando, com o abanar do rabo, Flare deixou cair uma pilha fedorenta de coro na estrada".
O livro todo é de uma narrativa alto astral, feliz, de quem curte e ama os cães. "Quatro Vidas de um Cachorro" é um texto para todas as idades e muito agradável nesse momento em que. a prioridade midiatica tem sido crises, guerras, crimes, corrupção e outras lambanças.
W. Bruce Cameron leva o leitor para esse mundo maravilho dos cães e suas ideias geniais. Ainda mais quando se tratam de cães com faros humanos e inteligência acima da média.
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