Literatura
Rosa de Lima
10/05/2015 às
11:40
ROSA DE LIMA comenta livro de Nestor Mendes Jr sobre lutas no Bahia
O Bahia foi fundado em 1931 e tem uma das mais vibrantes torcidas do Brasil
A literatura esportiva na Bahia ainda carece de mais publicações, mesmo com os clubes de futebol mais importantes na segunda divisão do campeonato brasileiro e a decadência acentuada do esporte amador onde os tradicionais segmentos esportivos - volei, baskete, boxe, atletismo, remo, etc - praticamente desapareceram do cenário competitivo nacional. No futebol, a tábua de salvação que ainda nos resta é o Bahia, bicampeão do campeonato estadual.
Recentemente, o jornalista Paulo Leandro publicou o livro "Negô! Baêa - A invenção da torcida Baiana - lançado pela Editora da Universidade Federal da Bahia (UFBA). A discussão central do livro é a instituição, representação e transformação das torcidas de Bahia e Vitória entre o período de 1932 e 2011, tomando como base as publicações dos jornais da cidade.
O jornalista Nestor Mendes Jr, analista da vida esportiva do Bahia e autor do melhor livro sobre o Clube - "Bahia Esporte Clube Felicidade - 70 anos de glórias", desta feita editou um novo livro intitulado Nunca mais! – 25 anos de luta pela liberdade no Esporte Clube Bahia - com apresentação de Juca Kfouri, e conta a história de 25 anos do movimento que resultou, em 2013, na derrocada do grupo de cartolas que comandava o Bahia desde a década de 1970.
O título da obra - segundo o autor - foi tomado por empréstimo dos versos do Hino ao Dois de Julho, de Ladislau de Santos Títaro: “Nunca mais o despotismo /Regerá nossas ações/ Com tiranos não combinam /Brasileiros corações”.
“A letra do Hino da Independência da Bahia reage a um governo sem leis, em que só uma pessoa possuía o direito de governar e a população não podia nem se manifestar. A mesma coisa acontecia no Bahia. E, posso garantir que, nunca mais, depois da democratização, o Bahia será o clube de um dono só”, explica Mendes Jr.
Escrito em linguagem jornalística tomando por base fatos relatados pela imprensa ao loongo desses últimos 45 anos anos, Nestor adiciona a esses acontecimentos observações de sua pena, cáusticas, firmes, sobretudo em direção a ex-diretores do clube Paulo Maracajá, Marcelo Guimarães e Marcelo Guimarães Filho uma 'troika' que comandou o Bahia com mão-de-ferro, sem respeitar os direitos dos demais conselheiros do clube e de sua imensa torcida.
O Bahia - é público e notório - foi fundado em 1931 e conta com uma das mais apaixonadas torcidas do país. Isso deveria fazer a diferença do ponto-de-vista da democracia tricolor. Os dirigentes, no entanto, faziam de conta que essa realidade não existia e a "Nação Tricolor" deveria ser usada apenas como coadjuvante do processo, comparecendo aos estádios para os aplausos. A velha politica mandonista que imperava no Estado contaminou a direção executiva do clube, à sua semelhança.
Embora ainda jovem, 84 anos de idade, o Bahia tem uma história emocionante - foi o primeiro campeão brasileiro, em 1959, repetindo o feito em 1988 - mas sempre foi o clube de um dono, de um grupo de pessoas que controlava sua diretoria executiva, atuava sem transparência e se utilizava da torcida como massa de manobra.
Segundo Nestor, o marco da luta pela democracia – uma batalha política renhida deflagrada nos bastidores do clube - foi o Movimento de Renovação do Bahia lançado em 1989, justamente no ano após a conquista título de Campeão Brasileiro de 1988 – em decisão que ocorreu no dia 19 de fevereiro de 1989, contra o Internacional, no Beira Rio.
“Durante toda essas décadas após o Bi-Brasileiro, houve uma incontida insatisfação entre os cardeais tricolores, no Centro de Treinamento do clube, o Fazendão, e em parte da torcida, contra o personalismo de Paulo Maracajá. As conquistas do hepta no Campeonato Baiano e do Campeonato Brasileiro de 1988 criaram a nuvem de fumaça que encobriria a verdadeira realidade do clube de um dono só, sem planejamento e sem qualquer visão de futuro”, conta Mendes Jr.
São esses e outros fatos que estão narrados com detalhes por Nestor no livro "Nunca mais! 25 anos de luta pela liberdade no Esporte Clube Bahia" sem rodeios, com texto escrito de forma direta, incisiva e corajosa.
O autor mostra ponto-a-ponto como o Bahia era dirigido à exemplo de um feudo familiar, como se fosse uma empresa passada hereditariamente de pai para filho, uma Capitania Hereditária , como parte da imprensa esportiva baiana se aproveitava dessa situação compactuando com esse modelo e se beneficiando também com essa matriz, de uma 'grande familia' onde todos se locupletavam e quem menos se favorecia era o clube e sua imensa torcida.
O livro mostra que não foi uma luta fácil derrubar esse grupo poderoso que comandava o Bahia e tinha suportes na imprensa, no Poder Judiciário e em parte do poder politico. Luta duradoura que ganhou mais forças e se robusteceu de forma mais acelerada a partir da redemocratização politica da Bahia, que se deu a partir de 2007, com a ascensão de Jaques Wagner no Executivo, e em 2005, no Judiciário, com Dutra Cintra, fazendo com que a 'troika' tricolor perdesse sustentação politica.
Nestor não mede as palavras. Coloca os textos e os comentários na forma mais direta possível, revela quem ajudou nesse processo entre os comunicadores do estado, relata o trituramento de Pithon, a farsa que representou as eleições de 2005, como a massa tricolor reagiu e foi às ruas, o papel de Carlos Rátis junto ao Poder Judiciário e a luta do próprio autor que foi perseguido e teve ações judiciais perante a 'troika'.
Quem deseja conhecer um pouco mais sobre a história do Bahia e esse exemplo da democracia tricolor para o país, pois, os movimentos conseguiram derrubar o madonismo e elegeram uma nova diretoria pelo voto direto dos torcedores associados ao clube, o livro de Nestor é campeão.
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