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Nó recursivo infinito |
O projeto em questão (PL 5475/2009) veicula "medidas para aprimorar a entrega da prestação jurisdicional e conferir eficácia às decisões judiciais", no que não destoa do recém concluído projeto do novo CPC (PLS 166/2010), cuja tônica foi a de "conferir maior celeridade à prestação da justiça", este em fase de recebimento de emendas.
Todos sabemos que a demanda pelos serviços judiciais vem, década após década, crescendo em escala geométrica, enquanto a estrutura e efetivos do Poder Judiciário avançam a trancos aritméticos.
Essa crucial equação não tem sido enfrentada com foco no impostergável redimensionamento estrutural e de pessoal, mas na inibição da demanda, mediante restrições processuais e jurisprudência defensiva.
No setor privado ao crescer a demanda o que se vê são negócios em expansão e resposta efetiva às novas exigências do mercado.
Já o Estado-juiz - detentor do monopólio da prestação jurisdicional - diante do crescimento da demanda responde impondo empecilhos aos usuários de seus serviços.
De sorte que, de reforma em reforma, de filtro em filtro, vai encolhendo não apenas o direito de defesa, mas o de amplo acesso à justiça.
São tidas por insuficientes as normas vigentes que autorizam a entrega antecipada da prestação jurisdicional; a rejeição liminar da demanda; o não recebimento de apelação que contrarie jurisprudência sumulada; a negativa de seguimento de recurso; a penalização da parte que provoca incidente manifestamente infundado ou protelatório, e a própria adoção do processo judicial eletrônico, entre outras.
É preciso mais, já que a clientela não para de crescer e parece não haver tempo para aguardar os frutos do novo modelo tecnológico de gestão processual em plena fase de implantação.
Dentre algumas das medidas restritivas concebidas está o fim dos embargos infringentes (não obstante o inegável prejuízo às causas em que preponderem questões fáticas, insuscetíveis de reavaliação pelos tribunais de superposição), assim como dos segundos declaratórios, salvo "liberalidade" do julgador (art. 7º, PL 5475/2009), e também do agravo de decisões interlocutórias.
Ainda, os advogados poderão recorrer das decisões desfavoráveis, mas não mais de forma intimorata, e sim com extremo receio, pois se a decisão impugnada for mantida nova sucumbência será imputada ao cliente, consoante prevê novel disposição que fragiliza o direito da parte à revisão do julgado (art. 922, PLS 166/2010), penalizando o seu lícito exercício.
A lógica subjacente às medidas cogitadas é de que os recursos, em regra, não buscam o aprimoramento da decisão judicial, mas simplesmente protelar o seu cumprimento.
Colhe-se da justificação do PL 5475/2010 que "é preciso que se inocule um fator de risco, um perigo de natureza econômica que ameace o interesse de protelar".
Com o mesmo entendimento manifestou-se o presidente da Comissão de Juristas incumbida de elaborar o anteprojeto do novo CPC, ministro Luiz Fux, sublinhando a necessidade de "desencorajar as aventuras judiciais que abarrotam as Cortes Judiciais do nosso país".
Segundo o Ministro, "A redução do número de recursos hodiernamente existentes. como a eliminação dos embargos infringentes e o agravo, como regra, adotando-se no primeiro grau de jurisdição uma única impugnação da sentença final, oportunidade em que a parte poderá manifestar todas as suas irresignações quanto aos atos decisórios proferidos no curso do processo, ressalvada a tutela de urgência impugnável de imediato por agravo de instrumento, coadjuvarão o sistema no alcance dessa almejada celeridade, sem a violação das clausulas que compõem o novo processo civil constitucional."
E quanto à crucial questão do subdimensionamento do Judiciário?
** Thomaz Thompson Flores Neto, advogado, membro do Instituto Brasileiro de Administração do Sistema Judiciário-IBRAJUS, autor do livro "Súmulas do STF e STJ anotadas - Quais perderam a aplicabilidade" (1ª ed., Editora Verbo Jurídico) http://www.thompsonflores.com.br
https://bahiaja.com.br/artigo/2010/08/18/a-perigosa-ideologia-antirrecursiva,531,0.html