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27/03/2007 às 11:00

Devolvam meu Bahia, devolvam minha Salvador

Nestor Mendes Júnior é jornalista

Nestor Mendes Júnior

   Salvador completará 458 anos no próximo dia 29 de março.

   Uma das primeiras cidades do Brasil - foi sua primeira capital - vem perdendo ao longo dos anos parte do seu encanto. Ocupação imobiliária desordenada, destruição do seu ecossistema, favelização e empobrecimento da população, governantes idiotizados da pior qualidade.

    E numa área específica - o futebol - Salvador vai, também, ficando para trás.

    Quando foi lançado, em 1990, o jornal Bahia Hoje - à época, o primeiro jornal totalmente informatizado da Bahia - fez uma pesquisa abrangente sobre os hábitos da população soteropolitana. E como preferência entre as opções de lazer, deu futebol na cabeça. Disparado. Ou seja, o baiano é apaixonado pelo futebol.

    E, como explicar que o futebol baiano vá tão mal?

    Clubes da capital só restam dois: o Vitória, fundado em 1889; e o Bahia, em 1931. Os demais - Botafogo, Ypiranga, Galícia, Leônico, Guarany, Estrela de Março, Redenção - praticamente inexistem.

    O Ypiranga, com 10 títulos estaduais, é um fantasma que habita em um CT abandonado na Estrada Velha do Aeroporto.

    O Botafogo, campeão do centenário da Independência do Brasil, em 1922, é uma lembrança nos olhos nostálgicos de seus fiéis torcedores, como o professor Luiz Valente, que se recorda dos craques do alvi-rubro como se eles tivessem ainda em forma: Leça, Tatuí e Alberto; Flávio, Nelinho e Júlio; Dedeu, Teco, Zague, Roliço e Lamarona.

    O Galícia é um sonho mofado que não se acha nem mesmo nas padarias dos patrícios galegos, porque as próprias padarias, aos poucos, vão desaparecendo.

    As áreas de recreação e desportos vão cada vez mais rareando. Os campos de várzea praticamente acabaram. Estádios, só temos dois. Um mal ajambrado, em Canabrava; o outro, portentoso mas decadente, como uma velho palacete de barão do açúcar: a Fonte Nova, inaugurada em 1951, ampliada em 1971, esquecida desde então. Módicos assentos plásticos - na terra que hospeda o pólo petroquímico - são artigos de hiperluxo.

    Os estádio do Galícia e de Pituaçu praticamente são figuras decorativas na geografia urbana do balípodo.

    O que foi feito do campo da Graça, do "Derby", no Rio Vermelho, da Fazendinha, no Costa Azul?

     Foram engolidos pelo "progresso" de uma cidade que cada vez mais perde espaços públicos para uma desregrada sanha imobiliária.

     Uma ilógica concepção urbanística que abandona toda a aprazível borda da Baía de Todos os Santos para destruir as matas de Pituaçu e nos enfiar pela goela um éden artificial e paulistano chamado Alphaville.

     Oh, quanto tirocínio e atualidade em Gregório de Mattos e Guerra!:

    "Estupendas usuras nos mercados,
     Todos os que não furtam muito pobres
     E eis aqui a cidade da Bahia".

     E os grandes clubes da capital, os dois que restam, sequer estão na divisão principal do Campeonato Brasileiro. Até o ano passado, a dupla BA-VI amargava as calendas da 3ª Divisão. O Vitória conseguiu subir para a Série B, enquanto o Bahia, para frustração de sua estupenda torcida, vive de humilhação em humilhação.

     Até no colorido Salvador perdeu. Nunca mais uma segunda-feira com as camisas tricolores embandeirando a Rua Chile, o Terminal da França, a Lima e Silva, a Avenida Sete, o Largo Dois de Julho.

      Devolvam meu Bahia, devolvam minha Salvador!



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