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20/03/2007 às 09:00

BUSH E A AMÉRICA LATINA

Rosane Santana é jornalista. Baiana do Extremo-Sul se encontra morando em Boston, Estados Unidos, fazendo curso de especialização na área de comunicação/literatura/história.

Rosane S. Santana

  O presidente dos Estados Unidos, George Bush, cumpriu recentemente agenda diplomática na América Latina, buscando uma reaproximacão com o continente, cujas relacões foram abaladas pelo crescente unilateralismo da política externa norte-americana, intensificado apos os atentados terroristas do 11 de Setembro, que interromperam as negociacões com o México de Vicente Fox sobre o destino e centenas de imigrantes daquele país em êxodo para o Norte, onde ocupam postos de trabalho rejeitados pelos americanos.

  Um assunto que interessa diretamente a cerca de 12 milhões de latinos residentes nos EUA, inclusive brasileiros. Bush revelou que o objetivo de sua viagem era "avançar na consolidação de uma democracia construtiva", mas não convenceu, especialmente ao presidente da Venezuela, Hugo Chavez, contra o qual apoiou um golpe abortado. Por isso o clima de crescente hostilitidade do presidente venezuelano que o chamou de "demônio" numa assembléia da ONU e, mais recentemente afirmou, na Argentina, quando da passagem de Bush pelo Uruguai, que este "e um cadáver político", entre outras coisas, num protesto, no mínimo, impróprio para um chefe de Estado (frise-se), apoiado por Nestor Kirchiner.

  Os Estados Unidos da Era Bush viram emergir na América Latina governos que se distanciam, de certa forma, dos interesses políticos e econômicos norte-americanos e as negociações a favor da Área de Livre Comércio das Américas (Alca) foram declinando a ponto de não constituirem mais prioridade, motivando acordos isolados com alguns países do continente.

  Na opinião de especialistas, a América Latina, com sua instabilidade institucional e os seus problemas políticos, não e necessariamente uma prioridade para a realpolitik (política realista, voltada aos interesses estratégicos dos EUA) americana, embora preocupe a incapacidade dos governos de países do continente de manter a segurança dos seus próprios territórios, como acontece hoje nos grandes centros urbanos do Brasil, a exemplo de São Paulo e Rio de Janeiro, onde organizações criminosas dominam espaços a revelia do Estado, apresentando riscos num mundo onde terroristas buscam instalar novas bases. 
 
  Essa, talvez, seja uma das razões não reveladas para a tentativa de reaproximação de Bush com o continente e sua intenção de "avançar na consolidaçao de uma democracia construtiva." Os especialistas advertem, no entanto, que os Estados Unidos só obterão êxito nessa direção, caso ajudem a impulsionar o crescimento dos países latino-americanos, inclusive Cuba, no sentido de encontrar caminhos em direção a um futuro próspero e livre na Era Pos-Fidel.

  Sem essa condição, acreditam que as tentativas de aproximação e acordo Norte-Sul estarão fadadas ao fracasso, com efeitos em todo o mundo, onde os EUA perderiam a batalha no combate ao antiamericanismo e na tentativa de transmitir valores democráticos ao resto do Planeta, inclusive no Oriente Médio, onde a derrubada de Saddan Russein teria sido um passo nesse sentido, independente dos interesses estratégicos pelo país que detém a segunda maior reserva petrolífera do mundo.

  Se os Estados Unidos cometem excessos com o unilateralismo de sua política externa, contribuindo para o recrudescimento do antiamericanismo em várias regiões do globo, a partir de iniciativas como a invasão do Iraque e a resistência ao Protocolo de Kyoto, no que diz respeito aos governos latino-americanos, no entanto, estes precisam fazer o dever de casa.

  Num mundo pos-fordista, no qual o estado de bem-estar social cede lugar a uma economia não-intervencionista, onde a competitividade, a produtividade e a política de resultados estão na ordem do dia, não é mais possível conviver com o desperdicio, a incompetência e a corrupção que são a marca registrada de muitos governos latino-americanos, inclusive no Brasil.

  O clientelismo, que remonta ao estágio colonial de nossa história, o familismo, o corporativismo respaldado por um sindicalismo anacrônico e não raras vezes corrupto, a proteção a grupos, a mistura entre os interesses públicos e privados, a substituição dos critérios técnicos por polítco-partidários nas indicações para cargos estratégicos, o "toma-lá-dá-cá" na vida pública, mesmo entre os que se dizem porta-vozes da modernização dos costumes políticos no Brasil, por exemplo, são práticas que comprometem a melhoria das condições de vida da população e seguramente explicam os péssimos índices educacionais, de saúde e de segurança pública registrados em nosso país e em todo o continente, onde o populismo de esquerda "sentou praça" e todos parecemos estar longe de uma solução.


https://bahiaja.com.br/artigo/2007/03/20/bush-e-a-america-latina,39,0.html