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20/11/2008 às 18:18

MUSEU DE NOVIDADES DE BARACK OBAMA

Rosane Santana é jornalista baiana residente em Boston, cursando Harvard

Rosane Santana


A força da mídia sustenta Madona e está mantendo Obama como estrela (Foto/Div)
 Há uma grande expectativa aqui nos Estados Unidos e no mundo sobre o governo de Barack Obama, celebridade midiática que está mais para Madonna do que para os tradicionais habitantes da Casa Branca.

  O senador que, segundo a sua rival nas primárias do Partido Democrata, convidada para ocupar a Secretaria de Estado, Hillary Clinton, absteve-se centenas de vezes em importantes votações no Congresso americano, provavelmente por falta de experiência em relação aos assuntos tratados, é quem vai decidir sobre os destinos do País em seu momento historicamente mais grave, a partir da posse em 20 de janeiro de 2009.

 

  É indiscutível, desde a campanha, a habilidade com que o presidente eleito usa a mídia, particularmente a Internet, para gerar fatos a seu favor. E essa habilidade casou com o interesse midiático pela novidade, especialmente o fato de ser ele o primeiro afro-americano eleito presidente dos EUA, após conquistar as primárias do Partido Democrata.

  Em palestra sobre O Discurso da Eleição Presidencial, na Universidade de Harvard, no verão deste ano, o professor George Grabowicz mostrou um estudo em que ficou clara a boa vontade da mídia com Barack Obama, inclusive nos programas humorísticos, nos quais até a respeitável Hillary Clinton era zombada com o fantasma Mônica Lewinsky.

 

  Barack Obama é um caso típico em que o meio é a mensagem e isso quer dizer que ninguém mais apropriado para manter vivo o mito da América como país das oportunidades, o que ele próprio admitiu, em diversas ocasiões, ao declarar que sua história não teria sido possível em outro lugar que não fosse os Estados Unidos. Mas essa identificação, ou melhor, essa conjunção de fatores que lhe são altamente favoráveis não serão suficientes para manter a governabilidade, se ele não conseguir administrar a crise econômica que, segundo especialistas, está apenas começando, e atingira o seu ponto mais alto em dois anos, ou seja, 2010.

 

  Em materia de economia não bastam uma boa retórica e performance midiática. A crise econômica que ajudou a eleger Barack Obama, num momento em que havia praticamente um empate técnico entre ele e o republicano John MacCain, pode levá-lo ao calvário. O presidente eleito sabe disso e ja trocou o habitual sorriso nas aparições públicas por um tom mais grave. Nenhum governante sai ileso se não consegue administrar satisfatoriamente as condições da vida material. Por enquanto, Barack Obama é apenas uma "esperançaa", e a esperançaa, como ensina Clarice Linspector, em A Paixão Segundo GH, "é a contemporização com o impossível".

 

  Nunca é bom esquecer que a crise econômica nos Estados Unidos é grave, muito grave. Ha falências bancárias, iniciadas com a insolvêcia no setor imobiliário, devido a incapacidade de a classe média pagar as prestações de seus imóveis. Agora, o mesmo risco ronda grandes montadoras como a GM, Chrysler e Ford, para as quais está prevista uma ajuda de 25 bilhões de dólares pelo presidente eleito. E o comércio varajista também já éatingido pela escaassez de créito, pois cadeias de lojas tradicionais estã quebrando.

 

  Caso mais recente e muito comentado por aqui foi a falêcia da Circuit City, que vendia eletrôicos e eletrodométicos. Outras lojas já acenderam a luz vermelha. Na Região Metropolitana de Boston, por exemplo, os shoppings centers andam às moscas. É possível passar por corredores inteiros desses "templos de consumo" e verificar que algumas lojas não possuem um só cliente comprando.

 

  Aliás, o que há mesmo é gente passeando, jovens se divertindo em máquinas de jogos eletrônicos ou em praças de alimentação, comendo pipoca, sanduiche e batata frita com ketchup, porque adolescente de classe média no mundo globalizado é igual em todo o lugar. Há milhares de desempregados e as redes de televisão mostram os índices da crise a todo instante. O mesmo acontece com dezenas de restaurantes. E pensar que o pior ainda está por vir, dá realmente medo.

 

  Barack Obama já declarou que não acredita em solução para os problemas sem a união de todos, retórica com a qual tentará repartir o ônus de possíveis fracassos, inclusive com adversários, dentro e fora do país, e da qual lança mão em momento de alta popularidade. Vai manter, por questões estratégicas, está claro, auxiliares do atual governo nas áreas militar e econômica - o calcanhar-de-aquiles da Era Bush - o que pode ser, portanto, uma faca de dois gumes, para quem se elegeu sob o signo da mudançaa. Convocou a ajuda de John MacCain, o candidato apontado por ele como do continuismo, e acenou para o diálogo com inimigos como Irã e a Coréia do Norte.


  "Vejo um museu de grandes novidades", como dizia o poeta.


https://bahiaja.com.br/artigo/2008/11/20/museu-de-novidades-de-barack-obama,272,0.html