Artigos
23/12/2007 às 11:06

HO,HO,HO,HO

César Rasec é jornalista e escritor

César Rasec

- Sejam bem-vindos! Feliz Natal!


- Feliz Natal também para você, tia Norma! Feliz Natal, tio Salustino!


- Fiquem à vontade, aqui é também a extensão da casa de vocês.


E os convidados, quase todos da mesma família, chegavam trazendo só presentes, já que comida e bebida não faltavam.


Aos poucos, pais, mães, filhos, avós, avôs, tios, sobrinhos, parentes distantes e amigos próximos iam chegando. Felizes, comemoravam mais um Natal juntos, e mais um ano de muitas conquistas.


Na área externa da mansão, perto da piscina, na rua onde o metro quadrado era o mais caro da cidade, as crianças corriam em volta das mesas sortidas com comidas e bebidas diversas, além dos presentes, cada um mais bem embalado e caro do que o outro. Estouros de champanha ecoavam pelo ambiente de fartura e de alegria.


- Comprei para o meu filho Felipe um carro do ano. Ele, acho, vai gostar, pois tem controle computadorizado de todos os comandos, desde a combustão até o consumo de combustível. Comentava Nelson em voz alta, que era filho de Salustino, e que, assim como o pai, conseguiu acumular muita riqueza neste ano que estava perto de terminar.


Em outra mesa, um grupo de mulheres comentava os novos lançamentos de jóias e vestidos.


- Vou ganhar um anel com cinco brilhantes, que deve custar uns dez mil dólares. É presente do meu marido, que adora me oferecer anéis valiosos. Já tenho, acredito, se não me falha a memória, mais de quarenta. A caixa é a menor de todas. É aquela embalada num papel azul-marinho com linhas douradas e fita vermelha, dizia Helena para as primas e tias.


E a festa ganhava uma proporção cada vez mais grandiosa, com muito glamour, fugindo da essência do sentido natalino. Na árvore de natal especial com pinheiro verdadeiro, todos que chegavam colocavam os seus presentes, para depois da ceia entregar aos seus parentes.


Caixas de todos os tamanhos embelezavam o pinheiro revestido por lâmpadas de variadas cores, que piscavam por vezes lentamente, por vezes com mais intensidade, sem muitas repetições.


Depois da ceia, com cardápio dos mais variados, os familiares e amigos preparavam para a entrega dos presentes, quando, de repente, entrou na casa um homem vestido de Papai Noel.


Salustino, como bom anfitrião, gritou para todos que a festa estava completa, pois Papai Noel havia chegado.


- Feliz Natal, Papai Noel, seja um dos nossos! Participe da nossa comemoração...


- Ho, ho, ho, ho...


- O que você trouxe para mim, Papai Noel? Quero um presente bem caro, pedia Linda, de oito anos, filha de Nicolau, um bem-sucedido homem de negócios, sobrinho mais velho de Salustino.


- Ho, ho, ho, ho...


- Eu quero uma carteira com muitos dólares, muitos, muitos dólares. Pedia Gerson, de 17 anos, amigo de infância de Hélio, filho caçula de Irineu, irmão de Salustino.


- Ho, ho, ho, ho...


E os pedidos iam acontecendo, cada um mais caro do que o outro. Após ouvir tantos pedidos, percebendo que alguns dos convidados para a ceia natalina já estavam mais exaltados do que os outros, sempre mantendo o seu sorriso maroto de ho, ho, ho, ho, Papai Noel pediu um pouco de silêncio.


Nessa hora, Norma, já com o seu colar de pedras preciosas, presenteado por Salustino, engrossou o pedido de silêncio de Papai Noel.


- Vamos ouvir o que Papai Noel tem para dizer, ou, quem sabe, para nos oferecer, já que tem algo em seu tradicional saco, que, pelo visto, está praticamente vazio, só com esse presente.


- Ho, ho, ho, ho...


- Vamos Papai Noel, o que você tem para falar, gritou Sérgio, irmão de Norma.


- Bem, já que vocês estão todos bem alimentados, cada um com um presente mais caro do que o outro, só me resta dizer a vocês que isso é um assalto.

Nesse instante, Papai Noel puxou do saco uma metralhadora automática e apontou para a cabeça de Salustino, que estava ao seu lado.


- Não quero acabar com a vida de vocês, só quero que coloquem os presentes no saco. Tem mais, se alguém ligar para a polícia eu vou terminar essa festa como se estivéssemos numa sessão de bangue-bangue, ameaçou o "bom velhinho".

E o saco foi passando de mão em mão, ficando cada vez mais cheio. Depois da limpa geral, Papai Noel pegou a chave do carro de Felipe e saiu em disparada pela cidade comemorando sozinho o seu Natal de terror.


- Ho, ho, ho, ho...


https://bahiaja.com.br/artigo/2007/12/23/hohohoho,154,0.html