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22/07/2021 às 20:04

A CIDADE DO SALVADOR NÃO É MAIS A MESMA, NEM NÓS

Livro "Aquele Jeito Baiano de Ser" na pena do jornalista Otto Freitas

ZédeJesusBarrêto

    Acabo de ler, devagarinho, o livro de crônicas do amigo, irmão e parceiro de letras Otto Freitas – “Aquele Jeito Baiano de Ser Boêmio”.  Tem gosto de ‘angu encubado’ com pimenta, regado a ‘gabrielas’, sentado na Cantina da Lua ao lado da morena com quem vamos descer a Ladeira da Praça, com malemolências e conversa mole, rumo à velha Barroquinha, a esperar o buzu na madruga, depois de ‘ozadias’ na cama de um castelo. 


 Só quem um dia dormiu escornado nas dunas do Abaeté, depois de uma serenata e muito chamego, ou cochilou desnudo num barco largado na praia da Ribeira, zonzo de fumaça, cuba libre e cheiro de fêmea grudado na pele saberá degustar o livrinho (carinhoso) do gordo Otto, um moço da cidade baixa, cidadão decente, bom de escrita e de farra, bebedor sabido, comedor de barriga farta. Delícias. 

 Sim, delícias de um tempo, de uma geração que foi feliz nas madrugadas de noites escuras, mas sem medos, encarando a vida com gostosuras de um tabuleiro de baiana. Copos, garfadas, companhias, música, risadas, prazeres...  de quem muitas vezes viu o dia nascer na esquina de Amaralina, cortando a ressaca com um prato de xinxim de bofe e uma gelada no ‘Gereré’ (acho que era assim escrito na fachada), antes de rumar pra casa, sem vergonha. 

  A Salvador dos anos 70/80, das festas de largo, da velha Fonte Nova, do Vila Velha, do Monte Carlo, das caminhadas longas sem receios nas madrugadas pelas ruas caladas, espiando a lua, catando estrelas, chutando latidos dos cães vadios, tempos dos babas nas noites de lua cheia na areia batida da praia de Piatã, da pinga com limão, acarajé e roda de capoeira no Mercado, uma cidade que pulsava xamêgo, mistura, crendices, criatividade, prazeres ...  Ou éramos nós que pulsávamos tudo isso? 

 Ah, gordo mestre Otto, obrigado. Mexeu num baú de lembranças, rebuliu saudades. “Aquele jeito baiano de ser boêmio” se foi.  A cidade não é mais a mesma. Nem nós.

Tá bem guardado e riscado. 


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