Por Nestor Mendes Jr.
Em 1972, o Brasil vivia os "anos de chumbo".
A ditadura militar instalada em 1º de abril de
1964 completava oito anos e, na sua infância
perversa e pervertida, já havia calado - ou pelo
menos tentado - todos os críticos. Pela tortura,
pelo exílio, pela cassação, pela exterminação, a
Redentora destruía todos os seus opositores.
E é no longínquo, e nada saudoso, 1972 que
se instaura no Esporte Clube Bahia a era Paulo
Virgílio Maracajá Pereira.
Segundo Tyrso, o
nosso endiabrado ponta-direita Chiquitinha,
ele dirigia um fusca e fazia os serviços de leva-etraz
de alguns jogadores na porta da Fazendinha.
Advogado, formado em 1966, Maracajá se
aproximou de Osório Villas-Boas - o cartola
que dominava com mão-de-ferro o Esporte
Clube Bahia desde a década de 50, idolatrado
pela massa tricolor pela ousadia de conquistar,
em 1959, a Taça Brasil e o título de campeão
brasileiro contra o todo-poderoso Santos, o
esquadrão monumental de Pelé e Pepe.
Com o passar do tempo, a cria superou o criador. Osório
mandava, Maracajá fingia. Osório nunca
passou do Paço, Paulo Virgílio Maracajá Pereira
foi vereador e, 10 anos depois, em 1982,
chegou à Assembléia Legislativa sufragado por
40.744 votos. Era a torcida do Bahia retribuindo
uma década de títulos: heptacampeão
baiano de 1973 a 1979.
Paulo Virgílio Maracajá Pereira, filho do
padre Pereira e ex-sócio da I. Pereira e da
Manopel, deixou uma frota de táxis em chamas
e alçou da baixa classe média para integrar
a elite do poder carlista na Bahia.
Em 35 anos, Paulo Virgílio Maracajá Pereira
conquistou inúmeros títulos. Dezenas de certames
baianos e o título de Campeão Brasileiro
de 1988.
No mesmo período levou o Bahia à
bancarrota: deixou um time inteiro ir para o rival
porque assinou sem ler, deu o primeiro tricampeonato
ao rubro-negro, reduziu o clube a um
quadro minguado de associados.
É responsável direto por dois rebaixamentos para a 2ª Divisão,
por dois anos na 3ª Divisão, por uma dívida de
R$60 milhões e por um futuro nebuloso.
Sem estrutura, sem planejamento, sem visão
estratégica, o Bahia está condenado a viver de
hemoptises. Grande parte da Fiel abandonou os
estádios. A minoria que vai à Fonte Nova ainda
assim faz do clube um dos campeões brasileiros
de público e renda. Os netos e bisnetos dessa
massa fantástica estarão na Fonte Nova em 2031,
no centenário do Tricolor?
Paulo Virgílio Maracajá Pereira fala manso.
Não briga. No mesmo diapasão em que a ditadura
silenciosa torturava os inimigos do regime no
pau-de-arara, impiedosamente, silente, ele destrói
os rivais. Usa o poder com a sutileza de uma
torquês na cutícula. Alguém está sempre pronto
a assumir-lhe a feição torquemada.
Se acha que lhe ofenderam a honra, o ventríloquo usa o
boneco para pedir reparação. Elimina, sem que
o semblante denuncie alguma contração, todos
aqueles que podem fazer-lhe sombra no projeto
megalomaníaco de ser o "eterno presidente".
E para ser eterno, o presidente se escudou
em medíocres.
O Bahia que jogou no Estádio
(sic) Floro de Mendonça, no Amazonas,
é o retrato impiedoso desse paradoxo: um
clube gigante apequenado pela mesquinhez.
Em 35 anos, Paulo Virgílio Maracajá Pereira é o
déspota dessa ditadura no Fazendão. Talvez sem
os métodos diretos de um Idi Amin Dada, de um
Ceausescu, de um Trujillo, mas com todos os seus
resultados.
Um homem que - só ele - se acha
invisível, mas que a Bahia e o Brasil inteiro sabem
que é o detentor absoluto da responsabilidade
pela falta de democracia, transparência, profissionalismo
e planejamento no Esporte Clube Bahia.
Com a obrigação de tirar o clube da 3ª Divisão,
disse que está pronto a disputar uma eleição direta
em 2008. O comandante-em-chefe supremo
da vergonha e da humilhação tricolores quer ser
o herói macunaímico de uma possível volta à
Série B, quando o caso é de indagar: "Quem
nos tirou da A?".
Como todo ditador tem um pouco de mágico,
Mister M quer agora hipnotizar o mundo
inteiro: quer ele próprio - "o eterno presidente"
- sepultar o "grande coveiro", como estava escrito
em uma faixa na Fonte Nova, desagradável
epíteto que já incorporou à sua biografia, iniciada
em 26 de março de 1944.
Repetindo Shakespeare, que o jornalista Gilson
Nascimento, de forma brilhante, escreveu,
como gostwriter, para um discurso proferido
recentemente no Tribunal de Contas dos Municípios:
"O tempo é muito curto para os que
festejam".
A ditadura, com certeza, ruirá.
https://bahiaja.com.br/artigo/2007/09/28/a-ditadura-de-maracaja,120,0.html