31/03/2018 às 10:49
SALVADOR 469 ANOS: Corrupção no Brasil chegou em naus portuguesas (TF)
Corrupção e roubalheira chegaram com as capitanias hereditárias e nas naus de Thomé de Souza
A corrupção e a roubalheira no Brasil chegaram ao país nas naus e caravelas dos donatários das 12 Capitanias Hereditáriase e seus investidores aventureiros, a partir de 1534, e na armada de Thomé de Souza que aportou na Baía de Todos os Santos para fundar a cidade do Salvador, em 29 de março de 1549.
Essas práticas tornaram-se endêmicas e completam, 184 anos (Capitanias) e 469 anos (fundação de Salvador) de existência, se propagam a cada ano neste século XXI, mesmo com as Operações do Mensalão e da Lava Jato, a primeira iniciada em 2005 e a segunda mais recente, porém, já com 50 etapas em andamento incluindo várias prisões e a condenação de um ex-presidente da República, Luis Inácio Lula da Silva, a sepultada esperança nacional.
O que se observa em todos esses anos de história do Brasil, a partir da instalação das capitanias e depois com o governo Geral na Bahia, é que a corrupção institucionalizada aqui chegou com dois dos mais influentes conselheiros da época, Pero Borges e Antonio Cardoso de Barros, respectivamente nomeados pelo rei Dom João III, Ouvidor Geral e Provedor Mor da Fazenda, cargos correspondentes, hoje, a ministros da Justiça e da Fazenda, ambos acusados de corrupção em cargos que exerceram em Portugal.
Na relação estado-igreja, desde a época do papa Calisto III, Portugal se tornara um Padroado e tinha permissão de nomear prelados em terras ultramar, jurisprudência eclesiástica, aqui chegou o bispo Pero Fernandes Sardinha, também acusado de corrupção, assim que o papa Júlio III criou a Arquidiocese do Brasil com sede na Bahia (a primaz) separada de Portugal pela bula "Super Specula Militantis Ecclesiae, em 25 de fevereiro de 1551.
Ao ser devolido a Portugal depois de atritos com o segundo governador da Bahia, Duarte da Costa e seu filho Álvaro da Costa, a nau D'Ajuda, que integrava a frota de Thomé de Souza, naufraga no litoral de Alagoas e o bispo com sua fortuna levada provavelmente em baú desaparecem para sempre. As moedas do bispo foram para o fundo do mar e o prelado salvou-se do naufrágio mas foi morto pelos Caetés, no local hoje conhecido como colina do bispo.
Ou seja, Estado e Igreja estavam aliados também na corrupção endêmica que persiste até os dias atuais.
Recentemente, bem recente, o papa Francisco (jesuita) promoveu a intervenção na Diocese de Formosa, em Goiás, onde o bispo d. José Ronaldo, um monsenhor e mais três padres foram presos acusados de corrupção, de embolsar o dinheiro dos fiéis e viverem em vida de luxo. Um rombo estimado em R$2 milhões e uma frota de carros.
Essa mesma acusação fora feita ao bispo Sardinha, lá no século XVI, pelo jesuita Nóbrega, dando conta que o bispo levava uma vida de riqueza fora dos ensinamentos do Cristo e da Igreja.
Vê-des, pois, que essa união é pérpetua e a corrupção segue impávida agora protegida por recursos judiciais de toda natureza em instâncias que garantem a impunidade dos réus.
Em depoimento do desembargador Pero Borges, na época das Capitanias Hereditárias, "abuso, corrupção e incompetência foram a regra, durante 15 anos", narra o historiador Eduardo Bueno. Conforme depoimento de Borges "o quadro geral no Brasil configura uma pública ladroíce e grande malícia".
A questão era que Borges representava um 'ficha suja' para usar uma expressão atual, pois, fora condenado no Reino por desvio de verbas numa obra pública, em Elvas, Alentejo, em 1543.
Borges fora encarregado de supervisionar as obras de um aqueduto, mas, as verbas se esgotaram sem que o viaduto ficasse pronto (hoje essa prática é comum no Brasil). Os vereadores denunciaram e o rei autorizou abertura de um inquérito. Apurou-se que Borges desviara 114.064 réis. Após vários recursos juridicos (também típico do Brasil atual) foi condenado a pagar à custa de sua fazenda o dinheiro extraviado".
Mesmo assim, por força do conde de Castanheira, Borges veio para o Brasil como ministro da Justiça e aqui praticou mais estripulias.
Já Antônio Cardoso de Barros, o homem da Fazenda, foi acusado de construir um engenho de açúcar no Recôncavo, de acordo com o segundo governador geral, Duarte da Costa, "com dinheiro do rei".
Denunciou Duarte a Dom João III: "Homem que tem engenho e faz fazenda nesta terra é muito prejudicial à de Vossa Alteza, e como ele a tem, e muito grossa, descuidava-se muito do que cumprira a bem do seu oficio". Cardoso de Barros também foi devolvido ao reino e morreu junto com o bispo Sardinha devorado pelos Caetés.
Meses depois que a notícia do naufrágio chegou a Salvador, o governador e seu filho Álvaro, teriam comemora a morte dos seus desafetos, o bispo e Cardoso, entre outros.
O caso do bispo foi mais pavoroso. Foi o padre Manoel da Nóbrega que insistiu junto a Simão Rodriges, seu superior da Ordem Jesuítica, em Lisboa, a necessidade de criar um bispado separado do Funchal.
Nóbrega advertia: "Não para fazer-se rico, porque a terra é pobre, mas para buscar as ovelhas tresmalhadas do rebanho de Jesus Cristo".
Sardinha era culto e fora um dos professores de Loyola, na França, onde morou e estudou por 11 anos. Depois serviu em Goa, capital do império português no Oriente, onde teria se horrizado com a corrupção no governo Martin Afonso de Souza.
Nomeado para a Bahia com salário anual de 200 mil réis recebido adiantado e deixado em Portugal, Sardinha chegou a Bahia em julho de 1552 e por 15 dias morou com os jesuitas. Depois mudou-se para uma das melhores casas da cidade que fora de Pero de Góis.
A primeira briga de Sarinha foi com os jesuitas vetando que os inacianos pregassem aos indígenas em tupi e impediu que os padres frequentassem capelas nas aldeias. Depois brigou com o governador Duate da Costa chegando a excomungá-lo.
Sarinha já tinha sido acusado de corrupção pelo governador de Goa, Garcia de Sá, por desvio de verbas. Em 1553, Sardinha foi a Pernambuco pregar contra o fumo (tabaco), mas, o principal objetivo da viagem era converter penas eclesiais em pecuniárias. Segundo denúncias, só em Olinda arrecadou 800 cruzados. Em cartas, Nóbrega denunciou o bispo dizendo que "rouba as pessoas o quanto pode".
A crise entre o bispo e o governador se agravou em 1544 e a cidade se dividiu com adeptos do bispo e do governador. Em 1556, a rainha Catarina (esposa de Dom João III, falecido) destitui o bispo e nomeia o bacharel Francisco Fernandes visitador e provisor de todo o bispado da Bahia.
Em 2 de junho de 1556, após 4 anos, rico, Sardinha deixa a Bahia ao lado de outros inimigos do goverandror. Em 15 de junho a nau naufraga em Alagoas e acontece o fim do bispo e sua fortuna.
Vale registrar que o governador Thomé de Souza, o qual já veio rico para a Bahia, foi considerado pelos historiadores como um gestor honesto e não exterminador dos tupinambás. Já o mesmo não se pode dizer de Duarte da Costa e Mem de Sá. O arquiteto Luis Dias também retornou ao reino sem máculas.
A corrupção e a roubalheira, no entanto, já haviam sido lançadas e se enraizaram no Brasil onde persiste até os dias atuais.
****Na próxima crônica vamos falar como a cidade do Salvador foi erguida em troca de anzóis e facões.
https://bahiaja.com.br/artigo/2018/03/31/salvador-469-anos-corrupcao-no-brasil-chegou-em-naus-portuguesas-tf,1092,0.html