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Zé de Jesus Barrêto

NA VARANDA DA COPA: "Velhinhos" de Felipão escolhidos

Expectativa é grande de como vai se comportar o Brasil (país) diante dos movimentos de rua e os protestos que virão com a Copa
08/05/2014 às 09:54
Resenhando: 

- Conhecidos os homens do Felipão! São 23. Eis: 
Goleiros: Júlio Cesar, Jefferson e Vitor. Júlio é o preferido dele, acho Vitor melhor. 
Laterais: Dani Alves e Marcelo certamente os titulares, mais ousados, ofensivos. Maicon e Maxwell , são mais marcadores.

Zagueiros: Tiago Silva (o capitão), David Luis, Dante e Henrique, a surpresa, escolhido até pela versatilidade, joga também pelas laterais e meio campo.
Apoiadores: Luis Gustavo, Paulinho, Ramires, William e Fernandinho, testados e aprovados.

Meias: Oscar e William. Ah, como gostaria de um Ganso em forma, competitivo.
Atacantes: Neymar, Hulk, Fred, Bernard e Jô. Temo pela condição atlética de Fred e pela qualidade técnica de Jô, mas não temos melhores no momento. 
No mais, na coletiva do treinador, aquele estilo direto, curto e grosso mas sereno do Felipão.

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- Do ex-presidente Lula sobre a Copa e as previstas manifestações de rua : “ Vocês imaginam, nesta altura do campeonato, com 68 anos, dos quais 38 fazendo protesto, eu vou ter medo de protesto? A Dilma, com 20 anos a bichinha estava presa, foi torturada, tomou choque para tudo quanto é lado por protestar. Agora ela vai ter medo de protesto? Quem quiser protestar, que proteste". Disse mais : "Se eu ficar dizendo que não pode ter [Copa] porque tem criança na rua, porque não tem escola para todo mundo, nós não vamos fazer nada... O que nós temos que compreender é que uma Copa do Mundo não se trata de dinheiro, de quanto vai entrar... não importa ... 

A Copa do Mundo é um estado, é um momento de encontro de civilizações em que o Brasil tem que mostrar a sua cara do jeito que é". Louvando-se: “Vamos ser francos, gente, poucos momentos neste país foram de tanta alegria como quando a gente conquistou [o direito de sediar] a Copa e a Olimpíada". Palavras de ordem.

- Da Presidente Dilma, coroando: “Na Copa de 70 eu estava presa. Em dias de jogos do Brasil todos paravam pra ver. Até os torturadores”. 

Então, sacaram o espírito da coisa? 

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- Ela, a presidente, vai dar uma ‘geral’ esta semana no Itaquerão, a título de ‘inauguração oficial’. É o estádio do Corínthians, menina dos olhos de Lula, que vai abrigar o jogo de abertura da Copa, Brasil x Croácia, dia 12 de junho. Ainda tem muita obra de acabamento por fazer e o entorno da Arena está cru, mas que importa isso agora? É o ‘padrão Brasil’, a Fifa que ‘se fifoda-se’. 

- A Arena das Dunas, em Natal, bela por fora, tem tapumes por dentro, mesmo inaugurada em janeiro. O governo do RGN ainda tenta instalar arquibancadas provisórias de 11.700 lugares, para que a capacidade chegue a 40 mil lugares, o mínimo exigido pela FIFA. A arena das Dunas abriga o jogo do México X Camarões, dia 13 de junho. Um corre-corre. 

- Mais grave. Na maioria dessas novas ‘arenas’ as comunicações são vexaminosas. Celulares, ipa(e)des, notebuques e tablets com sérios problemas de conexões, vagalumeando, engasgando, emudecendo em certos pontos dos estádios. Responsa do governo brasileiro? Fifa, operadoras? Quanta propaganda enganosa!

E somente três das 12 cidades-sede concluíram as obras previstas de reforço no sistema elétrico para a Copa: Recife, Natal e Fortaleza. Nas demais, os riscos de apagões continuam vivos. 

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- Mas, a nova sede que a CBF vai inaugurar no dia 4 de junho, na Barra da Tijuca, é um colosso e tem nome: José Maria Marim, ora. Um prédio em 6.640 metros quadrados que já consumiu mais de R$ 100 milhões, dizem que o dobro do lucro da entidade em 2013. Ostentação pura.
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- Vê-se que até agora a Copa não empolga o povão, tampouco o empresariado tupiniquim, sequer os do ramo hoteleiro. Tudo meio ‘pururuca’. Até o governo federal manifesta preocupação com o índice de desocupação dos hotéis no período do evento. Sobram vagas. Em Salvador, a agência operadora oficial de turismo da FIFA cancelou mais de 40% das reservas feitas anteriormente. Os preços das diárias foram reduzidos em cerca de 50%. 

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- O Mundial, no entanto, provoca ouriços em sindicatos e categorias que lutam por vantagens salariais e visibilidade. Na Bahia, depois da condenável greve da PM, estão parados servidores municipais, parando os policiais civis, rodoviários e federais e prometendo também os rodoviários (buzu), médicos, SAMU ... 

- Por outro lado, ou paralelo a isso, uma tal Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa do Mundo (Ancop) e outros ‘movimentos sociais’ organizaram um certo ‘Encontro dos Atingidos – Quem Perde com os Megaeventos e Megaempreendimentos’, semana passada, em Belo Horizonte, com o objetivo de planejar e unificar protestos e manifestações anti-copa. Participaram ativistas das 12 cidades onde acontecerão jogos. 
“Nós queremos juntar as diversas articulações de movimentos sociais, populares, sindicatos e todos os setores que neste momento estão comprometidos em levar uma mensagem de luta para o povo brasileiro para que a gente de fato organize uma jornada unitária”, argumentou um dirigente Central Sindical e Popular (CSP-Conlutas), Sebastião Carlos. O movimento Passe Livre presente, claro, mobilidade urbana continua uma bandeira forte, pois nada foi feito em termos de melhorias do transporte de massa urbano no país, desde o ano passado. 

A demanda nas ruas promete. 

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- O colunista Cláudio Humberto, um dos ‘bem informados’ de Brasília, revelou que os ‘black blocs’ andam a distribuir cartilhas contendo táticas de guerrilha, de olho na Copa. Definem-se como ‘revolucionários’. Referem-se a ações como emboscadas, assaltos, explosões, uso de coquetéis molotov, enfrentamento com militares, barricadas e até execuções. Ensina-se de um tudo, até a fazer uma bazuca caseira. Esperamos que os setores de informação e segurança do governo estejam cientes. Explosivo. 


- O Planalto reeditou um decreto, em vigor na Copa das Confederações, que prevê pagamento de passagens e hotéis nas cidades-sede da Copa para ministros, secretários-executivos e equipes de servidores, escolhidos para ‘trabalhar’ nos eventos. Os gastos chegam a R$ 1.162,00 por dia para cada felizardo. A gente banca as fuzarcas dessa cambada. 

- Na medida em que se aproxima o Mundial, os dirigentes e funcionários da CBF são mais e mais assediados por ‘autoridades’ querendo convites e mordomias para assistir jogos. Os pedidos chegam de palácios e gabinetes de todo naipe, até de ministros do STF. 

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Os ingleses, cuja delegação ficará no Rio de Janeiro, mandou à capital carioca o chefe de segurança da Federação Inglesa da Futebol, para avaliar o ‘clima’. Estão apavorados com as notícias de violência na cidade, como tiroteios nos morros, confrontos de gangues, ações da polícia etc... Vão montar um esquema de guerra como proteção. 

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Historiando

- A Copa de 1958, na Suécia, foi a primeira em que me liguei inteiro e dela sei detalhes de cor. Ouvi todos os jogos do Brasil de orelha grudada no rádio de seis faixas, tomada, antena no telhado, válvulas que esquentavam e aquela transmissão através de emissoras cariocas em ondas sonoras que mais iam do que vinham, o coração na boca e a cabecinha de menino a imaginar, desenhar, filmar cada lançamento de Didi em curva, cada drible de Garrincha com suas pernas tortas, cada lance de gol do menino Pelé, eles, os três, responsáveis maiores pelo fim da síndrome de cachorro vira-latas que nos humilhava, e também pelo desmonte do preconceito contra atletas de cor preta que nos afligia desde a Copa de 50, quando os racistas de todos os quadrantes do país puseram a responsabilidade da perda do título para o Uruguai, no Maracanã, em 1950, nas costas dos negros Barbosa, Bigode e Juvenal Amarijo, para sempre. 

Pois ali, nos campos da Suécia dos louros e loiras de olhos azuis, deslumbraram o mundo um descendente de índios fulniôs, de pernas tortas, o Mané Garrincha, um gênio, o nosso Chaplin; o príncipe etíope Didi, considerado o craque da copa, inteligência e elegância pura; e o garoto ‘neguim’ de 17 anos que encantou o planeta e, a partir dali, tornou-se REI, o maior Atleta do Século XX, uma espécie de entidade, um semi-deus dos gramados de nome Pelé. 

O Brasil jamais seria o mesmo depois daquela conquista. Fomos Campeões do Mundo, enfim. Mostramos nos gramados um jeito novo, diferente de se jogar bola, com pitadas de dança, negaças, ginga da capoeira... um jogo que, a partir dali, seria considerado arte, pela sua beleza e imprevisibilidade. O nosso país deve sim ao futebol, a Pelé (pela sua maior projeção e feitos), muito do respeito, do olhar diferenciado do resto do planeta sobre o tamanho do Brasil, a partir de então. 

Detalhe: Com Pelé e Garrincha em campo a seleção brasileira nunca perdeu. Como poderia? 

- O Brasil de 1958 era um país de 65 milhões de habitantes e 53% da população tinha menos de 20 anos de idade. Pura juventude, pujança. A inflação era de 12% ao ano e Juscelino Kubitscheck cumpria o prometido em campanha: faria 40 anos em quatro. Construía Brasilia no meio da selva e rodovias pelo país inteiro. Implantava-se a indústria automobilística com a produção do fusquinha em São Bernardo dos Campos. 
Ouvia-se nas rádios o Trio Irakitan, Maysa, Alcides Gerardi, Cauby, Ângela Maria, Elizeth Cardoso... e a Bossa Nova mexia com os ouvidos e o gosto musical de todos com ‘Chega de Saudade’, composição de Tom Jobim e Vinícius de Moraes que João Gilberto recriou com um violão tocado de forma absolutamente nova, estranha, numa interpretação minimalista, divina. Hoje, em qualquer canto do planeta onde se toca bossa-nova está a identidade brasileira.
 
A TV ainda não tinha chegado à Bahia, mas Salvador era tão mais negra e linda! E fervilhava como a capital cultural do país: música, dança, literatura, artes plásticas, cinema, teatro... a Universidade em ebulição.
 
As coisas estavam acontecendo na Cidade da Bahia, que acabava no largo de Amaralina, até onde chegavam os bondes elétricos. Para o norte eram praias, dunas, coqueirais sem fim e aldeias de pescadores. E o Bahia, depois de uma excursão vitoriosa em campos europeus, armava o grande time que se sagraria o Primeiro Campeão Brasileiro de Futebol, conquistando a Taça Brasil numa final de três jogos sobre o fantástico Santos de Pelé. A tal ‘baianidade’ em alta, orgulho de nascença e terreiro, a torcida tricolor embevecia na Fonte Nova e ser baiano era ser Bahêa! Eu tinha 10 anos de idade, terminava o primário. Como esquecer esse ano de 1958?