Colunistas / Literatura
Rosa de Lima

ROSA DE LIMA comenta sobre livro de Paula Hawkins

A jornalista britânica Paula Hawking deixa o (a) leitor )a) em suspense até o final do livro
26/03/2017 às 12:18
Diz-se ser lugar comum comentar-se em literatura que, quando se gosta de um livro, não consegue largá-lo enquanto a trama não chega ao fim. O envolvente numa ficção é extamente esse aspecto arrebatador de uma trilha, o leitor parece que vai saber o que acontecerá nas próximas páginas, idealiza algo em sua mente, mas, é surpreendido pelo (a) autor (a) que o deixa ainda mais interessado na obra. 

   Quando ele não tem essa surpresa, as peças de uma trama viram lugares comuns, perde a graça. Agora, quando, a cada página há  uma surpresa e o climax só se consuma nas últimas linhas, aí o livro é superinteressante.

   Creio que Paula Hawkins, a jornalista britânica nascida no Zimbabué, em "A Garota do Trem" (Editora Record, 377 páginas, 2017, R$70,00) consegue esse objetivo com sua obra de ficção passada em Londres e que nos narra, peça por peça, como num intricado jogo de xadrez, a morte de uma mulher a partir de observações que se iniciaram na janela de um trem numa linha do bairro Ashbury. 

   É no percurso do trem entre sua casa e o local de trabalho, trecho que fazia parte de sua rotina diária, que a autora desenvolve sua trama diante do comportamento de um casal que ela via quase todos os dias, na passagem do trem.

   Uma história aparentemente comum a primeira vista, mais um homicídio na sombria Londres, se ela própria -a garota do trem - não estivesse envolvida no crime, de forma indireta, porque o ato fora praticado por um ex-seu marido, de quem ainda era apaixonada, e o perdera por ter se tornada alcoólatra, não como fuga por causa do crime. 

   A garota do trem deixa, então, de ser uma observadora casual da pré-cena do crime para se tornar uma suspeita e ser investigada pela polícia.

   E por que isso aconteceu? 

   Nem ela mesmo sabia. Um enorme lapso de memória tomou conta de sua mente, a chamada 'ressaca moral' onde uma pessoa embriagada pratica atos, faz coisas, arruma encrencas, e no outro dia, com manchas de sangue no corpo não sabe o que aconteceu consigo.

   O bom do livro é que a 'garota do trem', não envolvida diretamente no crime, leva o leitor ao suspense, a imaginar que fora ela a autora do delito. 

   A autora consegue fazer o mais difícil no 'trilller' que é juntar peça por peça, o ex-marido, o casal que ela via da janela do trem, a nova mulher do seu ex-marido, um analista amante da morta, um investigador de policia despreparado, uma investigadora ardilosa, organizando peça por peça e fazendo com que o leitor vá se apaixonando pelo livro.

   Em determinado momento da trama ela conduz o leitor a acreditar que as suspeitas do crime recaiam sobre o amante da mulher morta, uma senhora de meia idade, pequena e atraente, diante um amante casual de consultório de análise, por quem se apaixonara.

   Depois, a suspeita recai sobre o próprio marido da mulher, um engenheiro que passava dias trabalhando fora de Londres, brutamontes ciumento e violento. E, finalmente, quando, cada peça vai se juntando, a 'garota do trem' no meio da trama porque passa a ser interlocutora desses dois personagens, ela descobre  (e não a Policia) que o crime fora praticado por seu ex-marido que também tivera um caso de amor com a morta.

   Livro envolvente e arrebatador porque a 'garota do trem', bêbada, ameaçara a nova mulher do seu ex-marido e tentara sequestrar sua filha. E, ao mesmo tempo, flagrada nesse ato, fora perdoada pelo ex-marido, ambos ainda apaixomados um pelo o outro. O álcool, a bebida em demasia praticado por essa personagem foi o que os afastaram, isso, muito antes do crime.

   As peças são um enorme quebra-cabeças porque todos os personagens moram num mesmo bairro, na linha do trem, e viviam num mesmo ambientel social. Todos se conheciam e tinham relações uns com os outros, exceto o amante estrangeiro da defunta.

   Um jogo de amantes, ex-amantes, bebidas, desalento, vidas perfeitas e imperfeitas, o cotidiano de um bairro, o desemprego, a sensualidade sem sexo, ciúmes, paixões, todo um caldo de cultura comum a qualquer comunidade que é abordado a partir das viagens do trem que a personagem principal do livro (Rachel) fazia diariamente do trabalho para casa e vice versa e via o casal feliz, em sua casa, como observadora da janela do trem até que a imprensa noticia a morte da mulher que ela imaginava viver o amor ideal

   A jornalista Paula Hawkins, experiente na linguagema acessível aos leitores, sem firulas acadêmicas e citações eruditas, tratando o tema como se desenvolve o dia a dia das pessoas, conseguiu fazer um livro de fácil leitura inteligente e repleto de reviravoltas. 

   E os leitores adoram esse tipo de suspense, de ser levado pelo autor, de ser conduzido pelo escritor (a) a cada capítulo com uma surpresa. Por isso mesmo o livro "A Garota do Trem" é tão bom e está na lista dos mais vendidos no mundo ocidental.

   Quando se imagina no capitulo final que é ela, a 'garota do trem', a bêbada, a insolente, a desprezada, a desacreditada pela Policia, que descobre o autor do crime e marca um encontro na sua ex-casa, com a mulher e a filha do novo casal na residência, os diálogos entre os três são inteligentes, surpreendentes, e o ex (Tom) desesperado joga uma mulher contra a outra, ambas agora cúmplices, e como não convence nem uma nem a outra, parte para a violência e tenta matar Rachel. 

   Na luta corporal, após Tom ingerir bebida alcoólica, Rachel consegue desvencilhar-se do ex-marido e o fere gravemente na garganta com um saca rolhas, nada mais apropriado instrumento numa trama de alcoólotras e semialcoólotras.

   Antes que a Policia chegue para socorrer os feridos, pois o ex-casal estava em sangue, a atual esposa de Tom termina o serviço enfiando a saca-rolhas no seu pescoço até que ele deixe de respirar. 

   Quando a Policia se apresenta o fato estava consumado. O crime da mulher da casa do casal feliz ou aprentemente feliz visto da janela do trema estava esclarecido, Rachel é socorrida num hosptal e Tom levado para o necrotério.

   A autora, sutilmente, finaliza a trama sem deixar claro qual a pena imputada às muilheres. A vida cotidiana delas seguem noutros caminmhos. Mas o trem está lá, o bairro está  lá, a Policia e seu detetive inepto estão lá, e Rachel pronta para pegar o trem, novamente, todos os dias, entre a casa e o trabalho.