Política

MUSEU DO ALJUBE EM LISBOA REGISTRA A MEMÓRIA EM DEFESA DA DEMOCRACIA

Intitulado de Resistência e Liberdade mostra a luta contra a ditadura salazarista e a sua policia politica PVDE
Tasso Franco , Lisboa | 22/01/2022 às 11:16
A imprensa alternativa como era produzida
Foto: BJÁ
     O Museu do Aljube - Resistência e Liberdade -  instalado na antiga Cadeia do Aljube, em Lisboa, inaugurado em 25 de abril de 2015 impressiona pelo realismo e quantidade de informações sobre a história e à memória do combate à ditadura no país, em defesa da liberdade e da democracia. Portugal esteve sob o domínio da ditatura entre 1926 a 1974, sobretudo o perído salazarista comandado por Antônio de Oliveira Salazar,  promotor do Estado Novo (1933–1974) e da sua organização política, a União Nacional, dirigiu os destinos do país como presidente do Ministério de forma autocrática entre 1932 e 1933 e, como Presidente do Conselho de Ministros entre 1933 e 1968. 

  O museu está instalado na cadeia do Aljube, freguesia de Santa Maria Maior, anterior freguesia da Sé, que foi um estabelecimento prisional que recebeu presos do foro eclesiástico até 1820, mulheres acusadas de delitos comuns até aos finais da década de 1920 e presos políticos do Estado Novo a partir de 1928 até ao seu encerramento em 1965. A palavra Aljube - de origem árabe - significa poço ou cisterna, prisão obscura e profunda.

 O edifício do Aljube terá sido utilizado como instalação prisional desde a ocupação muçulmana de Lisboa (sécs. VIII – XII). Usado posteriormente como prisão eclesiástica, sofre sucessivas adaptações até se tornar, entre os séculos XVI para o XVII, palácio de arcebispos, continuando, no entanto, a ser usado como cadeia para presos do foro eclesiástico. 

Após a implantação da Ditadura Militar em 28 de maio de 1926, a cadeia do Aljube é rapidamente utilizada para a detenção de “presos políticos e sociais”, designadamente na sequência das revoltas que marcam o início do novo regime, com presos sem julgamento.

Trata-se de uma cadeia às ordens das várias polícias políticas que marcam a transição da Ditadura Militar para o Estado Novo e que, com a atribuição à Polícia de Vigilância e Defesa do Estado (PVDE), em 1934. A cadeia foi usada pela polícia política para interrogatórios, recorrendo aí a diversos métodos de tortura – espancamentos, privação de sono e «estátua» – numa sala do último andar, calafetada com cobertores, para que os gritos das vítimas não fossem ouvidos – a «sala dos reposteiros». 

São conhecidos diversos casos de morte em consequência das torturas no próprio Aljube, como foi o caso do militante comunista Manuel Vieira Tomé, «que aparecera enforcado na manhã de 21 para 22 de Abril de 1934», depois de lhe arrancarem as unhas dos dedos das mãos e o sujeitarem a choques eléctricos, e do anarco-sindicalista Vítor da Conceição, falecido a 8 de Maio de 1934 por falta de assistência médica.

A Cadeia do Aljube ficou especialmente conhecida pelas celas de isolamento que foram construídas no início dos anos 40 do séc. XX. Feitos à medida de um homem estendido ao comprido e parecendo sarcófagos, os «curros» ou «gavetas» eram 13 pequenas celas de «solitária», situadas no 2.º andar do Aljube. Cada uma dessas celas tinha um catre basculante (ou bailique), que, quando estava para baixo, girando numas dobradiças, não possibilitava ao preso mexer-se – da tarimba que era estreita sobravam uns 15 centímetros até à parede oposta. 

Arlindo Vicente, advogado e artista plástico, candidato a Presidente da República pela Oposição Democrática descreveu assim os curros ou gavetas: “fui conduzido a um corredor onde havia uma parede longa com uma série de portas, metro a metro. (…) Aberta uma das portas, deparei com outra porta e a seguir um buraco, nele um catre, coberto com uma serapilheira e duas mantas. Ao lado um escarrador sobre uma “banqueta” e um púcaro de alumínio para a água. O buraco não tinha luz. Esta vinha da parte exterior quando se abria a porta, o que acontecia para ir à retrete ou quando se almoçava ou jantava”. E acrescentou: “dão uma angustiosa sensação de asfixia e desespero”. 

O QUE SE VÊ NO MUSEU

Todo esse cenário é reproduzido no museu nos quatro andares da antiga prisão com fotos e textos dos jornais da época, da panfletaria e dos métodos usados para disseminar a volta à democracia, material iconográfico enorme, réplicas das celas de isolamento com presos dentro, do papel da imprensa, de modelos de escritórios clandestinos, de passagens do governo salazarista, das manifestações de ruas e praças, prisões, torturas, um documentário riquissimo e que preenche uma lacuna na museologia lusitana.

O museu é muito visitado por portugueses e turistas de todas as nacionalidades e o ingresso custa 5 euros. Por ser idoso e jornalista tive acesso gratuito. Pode-se fotografar e até fazer videos em seus interiores. Os materiais sobre a imprensa clandestina da época é imenso desde como era produzido até a sua difusão desafiando a ditatura.