18/12/2017 às  10:26

HISTÓRIA DO VAQUEIRO festeiro e o PAPAI NOEL eletrônico

Pagou 50 reais e levou o Papai Noel eletrônico para casa, feliz da vida. Os 20 reais que lhe restaram não compravam nem o peru da Ceia



Zé de Guinha é um amigo de longas datas de Jeffinho. Nasceu e viveu lá pelas bandas do povoado de João Velho, no sertão de Ipirá, onde foi lavrador e vaqueiro. Naquele tempo, nem 20 anos tinha, era magricela, preciso no laço, dominava a montaria tal qual um cowboy de filme americano das antigas. 

Com oito irmãos, sendo seis mulheres, mesmo não sendo o primogênito Zé de Guinha se tornou uma espécie de líder da família, depois que a mãe se foi. Compenetrado com a responsabilidade, um dia deixou a roça e veio para Salvador, atrás de emprego e vida nova. Foi trabalhar na construção civil, como servente, depois pedreiro, mas logo virou mestre de obra, valendo-se do seu pouco conhecimento das letras e dos números, pois sabia ler, escrever e fazer conta. 

Foi morar no Cosme, nas encostas que formam o vale do Bonocô, na comunidade onde quase todo mundo é de Ipirá, seja parente ou conhecido. Aqui reencontrou Joaninha, mulata jeitosa, moça direita, batalhadora, amor antigo lá de João Velho. Reatou o namoro, casou e teve três filhos com ela. Joaninha criou os meninos e até hoje ajuda nas contas do mês: na casa onde trabalha, há mais de 15 anos, é quase da família. 

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Zé de Guinha gosta de comer e beber, é um exagerado. Não dispensa carne e fígado de carneiro na brasa; guisado de galinha de quintal e mocotó de boi. De tira-gosto, adora o peixe frito e a passarinha do boteco de dona Menina. Em tudo bota por cima muito molho lambão fresco e ardido. Para acompanhar, cachaça boa e cerveja gelada, ou o que houver engarrafado, tirando água. 

Com o tempo e a farra Zé de Guinha foi engordando, virou um mulato baixinho todo parrudo. Mas ainda é um cabra ligeiro, bom de serviço, de festa e de boemia. Se Joaninha deixar, ele dança até o sol raiar. No seu aniversário promove o maior evento de João Velho, para homenagear São Cosme e São Damião, devoção que herdou da mãe. Tem comida e bebida para todo mundo se empanturrar e o samba de roda vai até de manhã, sob o comando de Negão, cantador de primeira e sambador como nunca se viu no sertão da Bahia. 

   Mas a festa de que mais gosta é mesmo o Natal. Todo ano, como sem falta, Zé de Guinha enfeita a casa, por dentro e por fora. Não faltam guirlandas, cordões e mais cordões de pisca-pisca e uma árvore bem grande cheia de enfeites. Como sempre, tem muita comida e bebida, que o homem gosta de fartura, e não pode faltar o seu predileto peru assado.  

Se não tiver dinheiro, ele toma emprestado, mas a festa de Natal é sagrada. Certa vez, com a crise na construção civil, Zé de Guinha ficou desempregado. Não tinha uma banda de real no bolso; há meses Joaninha bancava as contas de casa sozinha. O homem foi ficando triste e deprimido; quanto mais perto do Natal, mais aumentava sua agonia. 

Até que alguém perguntou se ele não tinha restos de FGTS na conta. Uma luz se acendeu. Zé de Guinha partiu para a agência da Caixa na rua Chile. Voltou para casa cheio de planos, 70 reais no bolso, sete notas de dez, a raspa de tacho. No caminho, um camelô da praça Castro Alves lhe ofereceu um Papai Noel quase em tamanho natural, que se movia, se iluminava e ainda falava rô-rô-rô.

Zé de Guinha ficou entusiasmado. Pagou 50 reais e levou o Papai Noel eletrônico para casa, feliz da vida. Os 20 reais que lhe restaram não compravam nem o peru da Ceia. Mas pouco importava, faria a festa como sempre fez, um jeito haveria de dar. 

Na noite de Natal, a casa de Zé de Guinha estava mais bonita do que nunca, toda decorada, iluminada - e o Papai Noel eletrônico era a atração principal. Sobrinhos, netos, primos e todas as crianças da vizinhança correram para ver a novidade naquele cenário encantado. Só foram embora quando as luzes se apagaram, já de madrugada. 

Todo feliz com a alegria da meninada, Zé de Guinha ria pelos cantos da boca, petiscando seu peru assado e bebericando uma geladinha. Não cabia em si de tanto orgulho. Em silêncio, meditava com seus botões: valeu a pena.


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