01/04/2017 às  10:47

AXÉ CANTO DO POVO DE UM LUGAR, bem comportado

para falar com o colunista diogoberni@yahoo.com.br


   Manchester a Beira Mar, dirigido e roteirizado por Kenneth Lonergan, com Casey Affleck, EUA, 2017. O filme nos faz refletirmos alguns questionamentos. Por exemplo: somos ou estamos pré-determinados a sermos simpáticos; não podemos entrar em nossos escritórios com a cara feia só porque você brigou com a esposa? Ou seja: precisa-se de uma máscara para viver socialmente e ser aceito, e o filme reverbera este assunto através do seu protagonista de forma totalmente oposta ao qual estamos acostumados a presenciar. 

   O irmão caçula e oriundo do teatro do ator comediante Ben Aflleck faz um sujeito que tinha como premissa de profissão desentupir canos e, no entanto era uma espécie de sujeito que, a primeiro olhar, entrava na turma dos desencanados para tudo e todos. 

  Entretanto em um olhar mais aguçado, e isto só acontece quando o filme vai do meio para o seu final, então agora vemos que não se trata de ninguém desencanado, muitíssimo pelo contrário, ou seja, o sujeito era tão encanado que nada poderia mudar os seus problemas, então como não podia fazer nada o protagonista sai-se, ou melhor, parecia-se então como um desencanado sendo zelador de alguns prédios até receber a noticia da morte de seu irmão. 

   Tendo que voltar a sua cidade natal pelo ocorrido ele encontra seu sobrinho para cuidar, e isto em testamento. A relação é difícil, ambos são teimosos sendo que a única diferença entre eles é que um era adulto e outro adolescente. Se pudesse ter que resumir o filme em uma só palavra este seria angústia, sem dúvida.

    A angústia da dor que não pode ser acelerada nem atrasada, a angústia do tempo que a lembrança não permite esquecer, a angústia do erro. Se alguém diz que errar é humano então também seja possível que qualquer erro seja perdoável perante os outros, mas principalmente a pessoa que cometeu o erro. 

   Existem erros que nem o tempo e nem a aprovação de todos param de gritar em nossas mentes e este é um filme que tem como tema central exatamente isso: o erro que era para não errar. Se ficar escrevendo erro muitas vezes impreterivelmente darei alguns spoolers e esta não é a intenção. 

   O que adianto é que temos a situação do nosso protagonista zelador sendo pai de novo do seu sobrinho, e talvez isso seja demais pra ele. A riqueza do temperamento e personalidade do zelador é o que cativa o filme e o faz diferente dos demais por ser um filme de adulto, fato este raríssimo hoje em dia com obras tão infantis, pra não escrever o mínimo do mínimo. Evidente que foi a maior injustiça do Oscar, 

   Manchester a Beira Mar não ter ganho como melhor filme, pois o é de longe e galopada doutros que, chega a ser deveras estapafúrdia a comparação por ser o único filme de adulto concorrendo; sem dúvida um ponto ,ou um filme , fora da curva.
                                                                               ****

   Axé : Canto Do Povo De Um Lugar, dirigido e roteirizado por Chico Kertész, Brasil, 2017.  Apesar de ser soteropolitano nascido e criado aqui e ter orgulho disso, coloquei no bolso a minha empáfia de um cidadão underground da cena rocker soteropolitana e fui conferir a um filme que , hoje, nada tem a ver com a minha vida e relações, porém não sou estúpido e ignorante, pra não escrever hipócrita, em afirmar que não fui feliz em muitos carnavais cantarolando canções "olodunianas " que até os tempos vindouros reverberam minhas melhores lembranças carnavalescas.

    É importante também, e escrevo que até imprescindível, que o Brasil reconheça que em Salvador existe uma baita cena rocker de responsa que não deixa a dever a nenhuma outra cidade brasileira metropolitana, porém o foco aqui não é o rock baiano, mas sim o Axé Music: o ritmo que fez da Bahia ser reconhecida bem mais que o Raul Seixas ou a Pitty, e isso que o senhor Raul que me perdoe e não fique remexendo-se no túmulo com a constatação que o poder da batida de um tambor foi, e ainda é, bem mais forte que um solo de sua guitarra vivendo de forma alternativa. 

   Todos os grandes nomes do ritmo (Ivete, Daniela, Luis Caldas, etc) estão na obra do Chico, a sua primeira inclusive. A narrativa do documentário é fluida e os diálogos são agradáveis e producentes no sentido de dar as informações mais importantes no que era e o que se transformou o Axé Music: uma super máquina de entretenimento de fazer muita grana e criar, alias criar não, mas de magnetizar em forma de musas esculturais cantoras do ritmo que conquistou o Brasil nos anos 1990 e ainda hoje o ritmo Axé Music, com os seus trinta anos completados, continua batendo um bolão e comandando a massa brasileira, agora só que com a concorrência do sertanejo universitário. 

   Ou seja: para quem torcia o nariz sobre músicas de poucas letras e muitas melodias rebolativas e que deixavam o povo esquecer-se dos problemas diários de inflação e corrupção em Terra Brasilis. O Axé Music conseguiu chegar aos seus trinta anos de existência e com muita elegância e também um poder de renovar surpreendente , escreva-se de passagem.

    Hoje em dia a grande questão do carnaval de Salvador está nos espaços do camarotes Vips da folia, sendo que cada vez existe menos espaço para aquele folião que não tem grana para pagar um desses camarotes ou blocos fechados. São os chamados foliões pipocas , que ficam cada vez com menos espaços para curtirem o carnaval. essa questão é bem desenvolvida no documentário do Chico, filho de um ex-prefeito da cidade e atualmente um radialista de prestigio em Salvador. 

   A cada ano tenta-se bolar novas estratégias para que o título do carnaval de Salvador , ou seu slogan, ainda seja como : O carnaval para todos, mas o que vemos é que existe a cada ano que se passa um fortalecimento de um apartheid social onde quem tem grana curte o carnaval e quem não vai segurar a corda de um bloco de carnaval a troco de um misero retorno financeiro e um lanche com um sanduíche murcho e um suco quente no final da noite ou inicio da manhã, a depender do bloco que estiver sendo escravizado, assim como eram quando saíram da África para ajudarem a formar a nossa identidade brasileira. 

  O documentário se torna interessante por nos fazer pensar acerca e sobre tudo isso: essas desigualdades que a cada ano tem um poder de se potencializar ainda mais, se é que isso é possível. Particularmente vejo o carnaval da Bahia daqui uns 15 anos como único e irrestrito somente para quem tem "bala na gulha" para poder pagar há algum camarote ou bloco vip de alguma cantora de pernas e voz grossa. 

   O Chico, o diretor do documentário é um pouco mais otimista. Ele acha que o carnaval tende a ser devolvido ao povo como era antigamente. Pra mim é um caminho sem volta; vamos ver quem tem a razão daqui há uns quinze anos.


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