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02/09/2012 às 08:01

COOPERATIVISMO DE TRABALHO E SUA REGULAMENTAÇÃO

Priscila Greco é advogada

Priscila Grecco


Foto: DIV
Se faz necessária a aplicação, pelas cooperativas de trabalho de treinamento
O cooperativismo de trabalho há muito tempo aguardava a regulamentação de seu ramo, por meio de lei que norteasse a organização e funcionamento desse tipo societário e que suas atividades, pudessem, enfim, serem reconhecidas como lícitas.

Desde o ano de 1994, com a inclusão do parágrafo único ao artigo 442 na Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, que instituiu a inexistência de relações trabalhistas entre cooperados e cooperativa ou entre estes e tomadores de serviços da cooperativa, que o cooperativismo de trabalho tem sofrido com aqueles que interpretaram o parágrafo acima como meio de burla as legislações trabalhistas e tributárias.

Por esse motivo, entenderam os órgãos governamentais que uma nova normatização deveria ser promulgada às cooperativas de trabalho, a fim de que fosse claramente possível a distinção do empreendimento cooperativo idôneo daqueles que se interessavam.

Em 2005, calorosas e intensas discussões entre as cooperativas de trabalho e suas organizações representativas foram geradas a partir de um projeto de lei, essencialmente formulado pelos entendimentos, certos ou não, do Governo e Ministério Público de Trabalho sobre o cooperativismo de trabalho.

Inúmeros foram os esforços dos cooperativistas, e aqui se incluem todos àqueles que de alguma forma contribuíram para as discussões e sugestões de alteração do projeto de lei, em demonstrar as peculiaridades do modelo cooperativo de trabalho, o qual, até então, contava apenas com a Lei específica de n. 5764 instituída em 1971 e com parágrafo único do artigo 442 da CLT.

Sem dúvida, tais esforços, em algum momento, foram reconhecidos, já que foram aproximadamente treze anos de discussões e espera até a aprovação pela Presidência da República da Lei 12.690 em 20 de julho do presente ano.

Uma breve análise do novo regramento do cooperativismo de trabalho nos permite verificar que a intenção do legislador pautou-se no estabelecimento do adequado funcionamento dessas sociedades, de maneira a melhorar a condição econômica e as condições gerais de trabalho de seus sócios, adotando regras que efetivamente assegurassem a aplicação dos princípios cooperativistas.

Nesse sentido, a Lei 12.690/12 enfatizou o direito ao trabalho decente e digno, instituído na Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, na Constituição Federal e nas Convenções e Recomendações da Organização Internacional do Trabalho - OIT, principalmente sua Recomendação 193, que trata especificamente das sociedades cooperativas, aos cooperados, que devem estar amparados por normas mínimas de ordem pública, no que tange o exercício de suas atividades laborativas com dignidade, segurança e saúde.

Instituiu ainda o novo ordenamento jurídico, a natureza jurídica do trabalho associativo que se encontra na figura do trabalho "coordenado". 

 A constituição legal da figura do "coordenador" evidencia que os trabalhadores deverão executar suas atividades, sem a ingerência de terceiros, com autonomia, exercida de forma coletiva e coordenada, ou seja, mediante a fixação, em assembleia geral efetivamente representativa e democrática, das regras de funcionamento da cooperativa e da forma de execução dos trabalhos.


É importante observar que a atuação da cooperativa de trabalho no mercado é  caracterizada pela venda de resultados concretos, independentemente de quem o realiza ou quando e como este é realizado.


Como em qualquer relação entre pessoas jurídicas distintas, a relação entre a cooperativa e seus clientes, sejam estes pessoas jurídicas ou físicas, ocorre por resultados previstos em um projeto mensurável e remunerado pelos critérios estabelecidos neste, respaldados por uma relação contratual impessoal e institucional.


A proposta de revogação do parágrafo inserido na CLT, constante no artigo 30 da Lei em comento foi vetada pela Presidente Dilma, mantendo-se, portanto, a realidade fática apresentada caso a caso com a averiguação de fraude pelo Ministério do Trabalho, cuja punição será multa e ainda, aos responsáveis, sanções penais, cíveis e administrativas cabíveis.


É importante observar que embora o artigo 30 da Lei 12.690 tenha sido vetado, por um equívoco do legislador, permaneceu na ementa da Legislação além de outras disposições a revogação o parágrafo único do art. 442 da CLT. O que, como já mencionado, não ocorreu.


Todas essas características determinadas na nova Lei reforçam ainda mais a prática dos princípios cooperativistas da Gestão Democrática, da Participação Econômica dos membros, da Autonomia e Independência e especialmente o da Educação, Formação e Informação.


Hoje, mais do que nunca, se faz necessária a aplicação, pelas cooperativas de trabalho, da educação cooperativista por meio de treinamento, capacitação e formação aos seus sócios cooperados, administradores, coordenadores, colaboradores e empregados.


Nessa linha de raciocínio, a criação de uma Assembleia anual especial pela legislação 12.690, além daquelas obrigatórias pela Lei específica das cooperativas (Lei 5.764/71), que delibere, entre outros assuntos, sobre a gestão da sociedade, planejamento e resultado econômico dos projetos e contratos firmados e ainda a organização do trabalho, demonstra que o desenvolvimento dessas sociedades deverá se pautar, principalmente, na promoção de habilidades técnicas e vocacionais, capacidades empresariais e gerenciais, conhecimento do potencial de negócio e das habilidades econômica e social de cooperados e de todos àqueles que participam, direta ou indiretamente, do empreendimento cooperativo.


Há muito se observa que a falta de conhecimento, por parte dos sócios cooperados, da natureza jurídica existente entre cooperado, cooperativa e mercado e a definição inadequada do objeto social (affectio societatis) têm favorecido a proliferação de verdadeiras empresas de intermediação de mão-de-obra.


Assim, a educação cooperativista tem se demonstrado como uma aliada fundamental para o desenvolvimento das sociedades cooperativas, já que propicia a capacitação e a definição dos papéis dos cooperados, ou seja, o exercício da dupla qualidade, em que os sócios-cooperados são donos e usuários do empreendimento cooperativo simultaneamente.

 
Finalmente, acredito que o exercício eficaz do cooperativismo de trabalho deve se  pautar em três pilares: a) educação e conscientização dos associados quanto ao cooperativismo e à cooperativa da qual é membro; b) transparência na gestão da cooperativa,  e c) clareza no relacionamento da cooperativa com o mercado.
 
 
Priscila I. Grecco Oliveira
Advogada especialista em cooperativas
  


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