Direito

Dodge reitera inconstitucionalidade de decreto que concede indulto

Raquel Dodge reitera inconstitucionalidade de decreto que concede indulto a condenados por crimes contra a Administração Pública
Da Redação , Salvador | 29/11/2018 às 12:40
PGR é contra indultos a condenados por crimes contra administração pública
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Em memorial enviado na manhã de ontem aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, reforçou a importância de a Corte determinar a inconstitucionalidade de dispositivos do Decreto 9.246/17 que instituiu o indulto natalino. Em dezembro do ano passado – de forma inédita – Raquel Dodge propôs uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) contra o ato normativo, por entender que a medida extrapolou o poder presidencial, além de representar um retrocesso no enfrentamento a crimes como corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa. O julgamento do mérito da ação começou na última quinta-feira (22) e será retomado na sessão desta quinta-feira, 29.

No documento, a procuradora-geral explica que não se trata de questionar o indulto em si, mas o direcionamento que o texto do decreto permite. “Sem justificativa minimamente razoável, [o decreto] amplia desproporcionalmente os benefícios e cria um cenário de impunidade no país. Reduz em 80% o tempo de cumprimento da pena aplicada, extingue penas restritivas de direito, suprime multas e o dever de reparar o dano pela prática de crimes graves”, pontuou.

Raquel Dodge reitera ainda uma preocupação que tem externado desde o ano passado: a de que condenados por crimes contra a Administração Pública possam ser beneficiados, mesmo tendo cumprido apenas uma pequena fração (um quinto) da pena imposta pela Justiça e não tendo recolhido as multas pecuniárias que integram a condenação. No memorial, ela enfatiza que a grave situação carcerária do país (apontada como justificativa para a concessão do indulto) é complexa e não pode ser resolvida com a simples edição de um decreto de indulto.

 O documento enfatiza, ainda, que o decreto, tal como foi editado, inclui no rol de beneficiados pessoas que cometeram crimes que, “embora praticados sem violência, são tão ou mais danosos à sociedade brasileira, do que os crimes violentos”. Raquel Dodge lembra que estes condenados adotaram práticas lesivas à Administração Pública, à sociedade, que viciaram o sistema eleitoral, comprometeram a credibilidade das instituições e impediram que recursos públicos fossem destinados a serviços essenciais como saúde, educação e segurança pública.

Entregue a cada um dos ministros, o memorial também destaca o fato de que, apenas no caso de condenados em primeira instância na Operação Lava Jato, o decreto presidencial – caso tenha a redação original mantida – poderá beneficiar 22 pessoas. A lista inclui o ex-assessor parlamentar João Cláudio Genu e o ex-senador Gim Argello. A procuradora-geral enfatiza a gravidade dos atos praticados pelos possíveis beneficiados, destacando o impacto da medida para a efetividade das condenações penais. “O ato normativo, portanto, elastece a abrangência do indulto, a ponto de ensejar impunidade por crimes de alto potencial ofensivo, pelos quais houve condenação com base em devido processo legal”.

Separação e poderes – No memorial, a procuradora-geral afirma que o Decreto 9.246/17 fere o princípio da separação de poderes. Segundo ela, cabe ao Legislativo editar normas que definam condutas penalmente relevantes, descriminalizem ou que anistiem as condutas penalmente puníveis, pautado por critérios finalísticos adequados à política criminal. Para a PGR, ao conceder o indulto genérico e extremamente abrangente, o ato do chefe do Poder Executivo desconsidera a individualização da pena e suprime o exercício de função típica do Poder Judiciário: a jurisdição penal. Dodge ressaltou que o presidente da República não tem competência constitucional para legislar sobre matéria penal e não pode, por essa razão, extrapolar os limites da finalidade do indulto e estabelecer parâmetros incompatíveis com o princípio da proporcionalidade, o que acaba por se equiparar à descriminalização de condutas penalmente relevantes.

Poder limitado – Outro ponto mencionado pela PGR é o fato de o decreto extrapolar o poder do presidente da República. Na semana passada, durante sustentação oral no STF, ela lembrou que, em um Estado de Direito não há poderes absolutos e a jurisdição constitucional deve exercer o controle de atos normativos que ultrapassem seus limites, sejam esses formais ou materiais. “A competência constitucional para indultar não confere ao Presidente da República a prerrogativa de suprimir injustificadamente condenações penais”, reiterou em trecho do memorial.