Cultura

MANGA CHUPADA, CURTA DE DIOGO BERNI E O CONFLITOS DE ADOLESCENTES

Outro aspecto a se destacar da obra fílmica é o elo de amizade que o surfista tem com seu outro amigo; nos diálogos aparecem suas duvidas em relação ao futuro de dois garotos de classe média
Diogo Berni , da redação em Salvador | 24/06/2019 às 08:43
Mnga Chupada
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Manga Chupada, escrita, dirigida e produzida por Diogo Berni, Brasil/2018. Sei que soa suspeito em formular uma crônica/ critica acerca sob minha própria obra fílmica, todavia não tive como negar o pedido de uma pessoa tão querida que abriu espaço em seu site para um jovem apaixonado por filmes, começar a traçar suas primeiras linhas sobre o que é apaixonado: a sétima arte. Seria uma baita ingratidão se começasse a falar com ele sobre conflitos éticos de realizador e jornalista, e então, deste modo, aceitei o desafio. O projeto do filme Manga Chupada surgira de um conto, alias, de dois contos : o primeiro feito em 2007, quando morava em São Paulo, e o segundo já de volta a Salvador em 2015. 

Neste hiato de oito anos de um conto para o outro, continuei com minha profissão de crítico de cinema, esta estendendo-se até ano passado, e com sérias afirmações de que estou voltando ao ofício, basta, para isso, que algum festival de cinema me convoque, pois são nos festivais, vivendo set ou oito dias de cinema ininterruptos que as percepções sobre a vida de uma maneira geral, não só dos filmes, surgem e acabando fluindo em textos cinematográficos. 

Porém voltando a falar do meu filme, tenho que fazer ainda algumas ressalvas; primeiro: não tinha a menor ideia de que iria ser diretor e roteirista alguma vez na vida: estava feliz em ser critico de cinema, mas ei que de repente surgiu um convite de fazer a película, oriunda dos meus contos; claro que topei na hora, e foi uma das mais sábias decisões que tomei na vida. Embora tivéssemos contos, mas estes teriam que se transformar na bendita linguagem cinematográfica como um roteiro. 

Como não sabia a forma de fazer um roteiro, tive que fazê-lo sob a ajuda do diretor de fotografia do filme, e pasmem: fizemos o roteiro em um mês intenso e via Gmail, isso mesmo. O Gleidson Alves dava um pitaco e eu, outro, e daí nasceu o roteiro : pela internet ! As gravações ocorreram em dois dias: uma na praia e outra no mato, mas vamos ao que interessa que é a estória do filme. Pois bem, antes de qualquer coisa é preciso explicar o nome do filme. 

Manga Chupada fora a minha primeira prancha de quilhas, quando tinha por lá dos treze anos e fazendo a transição do Body Boarder ( ou morry bug ) para uma prancha de bico. A mudança, para minha tenra idade, era atípica e perigosa porque as quilhas e o bico frequentemente feriam, às vezes seriamente, alguns dos praticantes conhecidos meus, e mais velhos.

 Como tava na frenética vontade de me arriscar a furar minha cabeça com o bico, aceitei a primeira prancha que me deram de presente, vendo aquele pré-adolescente agitado. A prancha era tão chupada do sol que um dia um amigo meu da minha idade, que ainda surfava com o “Morry Bug”, viu o calhau e cravou rindo : “Porra Diogão , essa sua prancha parece uma manga chupada, será que vai afundar quando você subir nela?” . O filme em si conta um dia de surf de dois amigos pré-adolescentes sentindo os sabores e os dissabores em mudar de uma faixa etária para outra, ou seja, de transformassem em homens ou homenzinhos. 

Com atores da mesma faixa etária o filme enreda as responsabilidades e desafios dessa transição de idades, e principalmente de mentalidades. Na verdade o que quis fazer fora um retrato alternativo do que pode vir a ser a cabeça de um garoto de treze anos de idade, e este mesmo garoto,por conseguinte, contestando a todos os valores sociais e morais que o impõem até então. Por exemplo: será que o modelo de um colégio é de fato eficaz ao ensinar somente o que vai cair no vestibular, será que os valores que temos que aprender para “se dar bem na vida” se limitam em você tirar uma nota boa e consequentemente passar em uma universidade pública, sendo que seus pais tem dinheiro para custear uma particular, tomando a vaga, inclusive, de alguém que não teria esse apetite financeiro paterno, materno ou ambos?

 Enfim, o garoto, indo surfar começa a se indagar do que tudo que ele até então tinha aprendido na vida como correto seria uma tremenda falsidade. Com essa angústia no peito ele pega a sua namoradinha Manga Chupada e começa a remar inconsequentemente até furar a rebentação de um dia de mar agitado. 

Outro aspecto a se destacar da obra fílmica é o elo de amizade que o surfista tem com seu outro amigo; nos diálogos aparecem suas duvidas em relação ao futuro de dois garotos de classe média, e se “ser “ extremamente radical seria a melhor das saídas. Entretanto de uma coisa os dois concordavam: morriam de medo de se transformarem em adultos idiotas e superficiais que só pensam em dinheiro, sabedores que as melhores coisas da vida são grátis, como uma boa onda surfada ou um bom “couro” que se dá em uma gatinha, maluquinha igual a eles.

Em tese objetivo do filme é então instigar pessoas, e não importa as suas idades, porque nunca é tarde pra mudar ( antes tarde do que nunca, como já diz o ditado ) a sua maneira de pensar e agir diante de situações com pessoas e instituições. Manda quem pode e obedece que tem juízo, mas se perguntarmos o que é juízo, quem o fez e para quê fez? A resposta é demasiada complexa pelo fato do “juízo” ser arbitrário, ou seja, o que é correto para alguns pode, e na maioria imensa das vezes é prejudicial a muitos outros. 

O que quero explicitar é que o poder de alguns sempre desbeneficiará a outros; assim é a lei natural da vida humana desde o tempo das cavernas ( enquanto uns dormiam outros iam caçar, mas poderia acontecer que este que ficou dormindo, estivesse com mais energia em comparação ao outro cansado de caçar e quando o chegasse com a caça na caverna o dorminhoco audaz surrupiasse a caça e comesse sozinho, enfim é a lei do mais forte e acima de tudo, do mais adaptado a ser esperto ) . 

No filme fiz questão de mostrar, logo no seu inicio, a imagem de duas mangas chupadas, fazendo um paralelo entre a situação do homem com a sociedade, dando a ideia de que poderemos ser chupados, como aquelas mangas, se for audaz e esperto o suficiente para enganar o jogo social, ou seja, respeitar seus modos-operantis, mas sempre desconfiar deles, afinal a pergunta que não quer calar, e que ficou escancarado no filme, é: Quem fez as normas, quem ganhará e perderá com elas, suas justas, obedece a premissas humanas básicas? É bom viver, mas melhor ainda é saber viver. Deixarei o link do filme abaixo, caso tenham curiosidade.